Newsletter
Ciência e Cultura - Agência de notícias da Bahia
RSS Facebook Twitter Flickr
Atualizado em 6 DE abril DE 2011 ás 23:45

Biodiesel: microalgas e a importância da diversificação das matérias primas na Bahia

Bahia tem como insumos mais utilizados para a produção de biodiesel o dendê, o algodão, a mamona e a soja. O dendê é considerado de melhor custo-benefício por ter um maior aproveitamento na extração do óleo, mas a cultura tem desvantagens reconhecidas no ponto de vista ambiental, que nem sempre são mostradas às claras por governos e produtores

Wagner Ferreira*
wagner.ferreira@ufba.br

A demanda por energia limpa é cada vez maior em todo o planeta. Não há disputa entre os combustíveis chamados renováveis e fósseis. Pesquisadores têm em mãos um dos seus maiores desafios: construir sistemas integrados de energia e alimentos, que levem em consideração formas específicas de acesso aos recursos naturais e tenham como base a valorização de padrões de uso sustentável e ocupação do solo. No âmbito do meio ambiente, o efeito estufa deixa cada vez mais quente o planeta. Isso acontece devido o aumento de dióxido de carbono na atmosfera (para cada 3,8 litros de gasolina que um automóvel queima, são liberados 10 kg de CO2 na atmosfera). A queima de derivados de petróleo, chamados combustíveis fósseis (não renováveis) contribui para o aquecimento do clima global por elevar os níveis de CO2 na atmosfera.

Tendo em vista tais desvantagens, o governo brasileiro tem estimulado a produção e a comercialização do biodiesel. Para isso, publicou o Decreto No. 5.488, em 20 de maio de 2005, que regulamenta a lei 11.097 (janeiro / 2005) para a introdução do biodiesel na matriz energética brasileira. Desde o ano da lei até 2008, a proporção autorizada na matriz energética brasileira foi de 2% do diesel comum e 5% até 2013, mas já são pensados 20%, uma vez que nos Estados Unidos, os automóveis movidos com 100% de biodiesel têm apresentado rendimentos surpreendentes. Mesmo com motivações política e econômica, que levou o Brasil a diversificar sua matriz energética, ainda é necessário encontrar equilíbrio entre as oportunidades desse novo mercado e os entraves tecnológicos.

A Bahia tem como insumos mais utilizados para a produção de biodiesel o dendê, o algodão, a mamona e a soja, destes, o primeiro é considerado de melhor custo-benefício por ter um maior aproveitamento na extração do óleo, base do biodiesel. Apesar do alto rendimento, a cultura tem desvantagens reconhecidas no ponto de vista ambiental, que nem sempre são mostradas às claras por governos e produtores. O empobrecimento do solo, onde a cultura é cultivada em médio prazo e o alto grau de desmatamento das florestas, para dar espaço às plantações de dendezeiros é só um dos problemas crescentes, uma vez que a demanda por biodiesel derivado do dendê tende a aumentar em todo estado.

Essas barreiras começam a ser derrubadas na Bahia com a realização do primeiro Workshop Internacional Sobre Bioenergia e Meio Ambiente, que aconteceu em junho de 2010 em Salvador e reuniu pesquisadores envolvidos com o tema bioenergia, para compartilhar informações, idéias e construções de novos projetos que visem à produção em larga escala de energia renovável no estado.

O Workshop apresentou uma alternativa ainda pouco apoiada pelos governos federal e estadual, mas que no mínimo deve ser observada com mais interesse pelas agências financiadoras de projetos para uma possível produção em larga escala de biodiesel através da biomassa algal (microalgas).

O tema foi explanado pela doutora em Biologia Marinha pela USP e coordenadora científica do Laboratório de Ecotoxicologia e Biomonitoramento da Ufba, Iracema Nascimento. A pesquisadora buscou com a realização do Workshop, convencer os representantes de instituições financiadoras a liberar recursos para que se torne possível, em médio prazo, a substituição progressiva do uso do dendê pelas microalgas como primeira alternativa de energia limpa dentro do estado.
Para isso, a pesquisadora contou com o apoio de nomes importantes em nível mundial, que já desenvolvem trabalhos com o cultivo de microalgas na Itália e Espanha, como o Dr. Giovanni Sansone da Universidade di Napoli Frederico II e o Dr. José A. Perales Vargas do Centro Andaluz de Ciência y Tecnologia da Universidade de Cadiz na Espanha.

Iracema Nascimento durante Workshop no Othon Palace

No início dos trabalhos, Iracema Nascimento mostrou o processo de captação, armazenamento e produção em cativeiro das microalgas, que segundo a pesquisa, pode render entre 50 a 150 t de óleo por hectare/ano, vantagem 25 vezes maior sobre o dendê, que rende de 3 a 6 t por hectare/ano.

As microalgas ainda saem na frente do dendê simplesmente devido a sua origem marinha. Elas crescem em lugares que não terras agrícolas, o que evita danos ao ecossistema, já que não é necessário o uso de agrotóxicos ou fertilizantes. A água, utilizadas nos tanques e reservatórios para o cultivo das microalgas pode ser reutilizada para uso humano e animal.

A pesquisadora ainda explicou que com o uso de microalgas como matéria prima na produção de biodiesel não há o risco do comprometimento da produção de alimentos, comum em outras culturas utilizadas em grande quantidade na produção de biomassa.

Estima-se que cada tonelada de biomassa algal consuma 2 toneladas de CO2, por meio de fotossíntese. Isso representa 10 a 20 vezes mais do que o absorvido pelas culturas oleaginosas tradicionais.

Cultivo de microalgas

Algumas vantagens do biodiesel

  • A queima do biodiesel gera baixos índices de poluição, não colaborando para o aquecimento global.
  • Gera emprego e renda no campo, diminuindo o êxodo rural.
  • Trata-se de uma fonte de energia renovável, dependendo da plantação de grãos oleaginosos no campo.
  • Substitui o diesel nos motores sem necessidade de ajustes.
  • O produtor rural estará produzindo seu combustível.
  • Diminuição da poluição atmosférica.
  • Redução de custos na propriedade.
  • Deixa as economias dos países menos dependentes dos produtores de petróleo.
  • Produzido em larga escala e com uso de tecnologias, o custo de produção pode ser mais baixo do que os derivados de petróleo.
  • O biodiesel é usado puro nos motores, porém aceita qualquer percentual de mistura com o diesel, pois é um produto miscível.
  • Na formação das sementes, o gás carbônico do ar é absorvido pela planta.
  • O calor produzido por litro é quase igual ao do diesel.
  • Pouca emissão de partículas de carvão. O biodiesel é um éster e, por isso, já tem dois átomos de oxigênio na molécula.
  • Na queima do biodiesel, ocorre a combustão completa.
  • É necessária uma quantidade de oxigênio menor que a do diesel.


Algumas desvantagens do biodiesel

  • Se o consumo mundial for em larga escala, serão necessárias plantações em grandes áreas agrícolas. Em países que não fiscalizam adequadamente seus recursos florestais, poderemos ter um alto grau de desmatamento de florestas para dar espaço para a plantação de grãos. Ou seja, diminuição das reservas florestais do nosso planeta.
  • Com o uso de grãos para a produção do biodiesel, há a possibilidade do aumento no preço dos produtos derivados deste tipo de matéria-prima ou que utilizam eles em alguma fase de produção. Exemplos: leite de soja, óleos, carne, rações para animais, ovos entre outros.
  • Os grandes volumes de glicerina previstos (subproduto) só poderão ter mercado a preços muito inferiores aos atuais; todo o mercado de óleo químicos poderá ser afetado. Não há uma visão clara sobre os possíveis impactos potenciais desta oferta de glicerina.
  • No Brasil e na Ásia, lavouras de soja e dendê, cujos óleos são fontes potencialmente importantes de biodiesel, estão invadindo florestas tropicais, importantes bolsões de biodiversidade. Embora, aqui no Brasil, essas lavouras não tenham o objetivo de serem usadas para biodiesel, essa preocupação deve ser considerada.


Entendendo bioenergia

    Os biocombustíveis constituem apenas um segmento da bioenergia, que inclui ainda o carvão vegetal, biogás, lenha e a co-geração da energia elétrica e calor a partir das biomassas. A grande vantagem do biodiesel em relação aos combustíveis fósseis é sua obtenção a partir de qualquer óleo vegetal, além de gorduras animais, e, diferentemente do etanol, sua produção, mesmo não sendo exclusiva da agricultura familiar, tem forte componente social, bem como vantagens econômicas e ambientais.

    A utilização de energias renováveis – hidroelétricas, energia de biomassa, solar e eólica, pode contribuir para a preservação ambiental e tem como pressuposto o desenvolvimento sustentável. Entretanto, ainda representa um grande desafio científico e tecnológico. Novas tecnologias em energias renováveis devem ser integradas às circunstâncias econômicas, políticas e culturais em cada território. No caso da Bahia, a atenção dada pelos órgãos competentes às microalgas se faz necessária, a fim de diversificar e ampliar o leque de culturas disponíveis no estado e assim encontrar a que gere maior produtividade, menores custos de produção e impactos sócio-ambientais. Para isso, é necessária uma difusão qualificada dessas tecnologias, sempre observado pelo olhar desconfiado da imprensa especializada.

*Jornalista pós-graduando em Jornalismo Científico e Tecnológico pela Ufba

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *