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Atualizado em 11 DE setembro DE 2014 ás 15:58

A invisibilidade do aborto no sistema público

A reestruturação do serviço público é um dos fatores preponderantes para a melhora dos atendimentos aos casos de aborto no Brasil. Na Bahia não é diferente, atualmente só existem dois locais para a realização de abortos legais no estado.

ANALÚ RIBEIRO
analluribeiro@yahoo.com.br

O tema aborto é uma discussão recorrente no Brasil que ainda persiste sob alguns paradoxos. Os valores morais e religiosos na maioria das vezes permeiam as discussões sobre a supressão da vida humana, desconsiderando a mulher enquanto protagonista social, capaz de tomar decisões sobre seu corpo.

Dados da última Pesquisa Nacional de Aborto (PNA), realizada pela Universidade de Brasília em parceria com a Agência Ibope Inteligência e o Ministério da Saúde, em 2010, revelou que uma em cada sete mulheres brasileiras já realizou aborto. Essa estatística demonstra que o tema deve ser tratado no âmbito da saúde pública, sem desconsiderar os direitos humanos das mulheres. Apesar dos dados revelarem que o aborto é recorrente na vida das mulheres, ele ainda é tratado de maneira paradoxal. “A maioria das pessoas no Brasil, inclusive as que já realizaram o aborto, se opõe a legalização”, afirma a antropóloga Cecília McCallum.

A espera angustiante / Foto: Victória Libório

A criminalização do aborto no Brasil é uma das discussões mais polêmicas no país, inclusive na esfera política. De um lado, a bancada evangélica do Congresso Nacional se mantém forte contra a legalização. Por outro lado, os abortos não deixam de ocorrer mesmo sendo considerados ilegais. “Nada do que é feito a respeito da criminalização tem convencido as mulheres a desistirem dos abortos”, afirma Cecília. A ilegalidade favorece um mercado abortivo, onde muitas clínicas atuam sem se preocupar com a vida das mulheres. “Na clandestinidade, o caminho entre as mulheres se diferencia bastante”, analisa a médica e pesquisadora do Programa Integrado em Gênero e Saúde do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA (MUSA), Greice Menezes, ao ressaltar que mulheres com maior poder aquisitivo vão aos locais com um atendimento que prioriza o cuidado com a saúde da paciente, já aquelas com menor poder aquisitivo correm mais riscos, na busca pelos procedimentos, a exemplo do uso do medicamento Misoprostol, popularmente conhecido por Citotec, que pode causar graves problemas à saúde.

Tensões

Um dos dilemas referentes ao aborto diz respeito às equipes de saúde. Muitos dos profissionais que atuam nessa área se opõem a realização dessas cirurgias. “Os Conselhos das áreas de saúde são favoráveis a descriminalização do aborto, entretanto seus profissionais ainda padecem de falta de informação e capacitação”, conclui Greice Menezes.

Pesquisadora Greice Menezes / Foto:Salete Maso

Mulheres que sofrem de aborto induzido ou provocado, são atendidas em maternidades e isso favorece essa perspectiva de não – cuidado por parte dos profissionais. “A  mulher é considerada uma anti-mãe”, destaca Cecília McCallum ao evidenciar as mensagens simbólicas que norteiam o fato de em uma maternidade estarem mulheres que dão a luz e aquelas que perdem ou provocam a perca de seus bebês.

Estado Laico?

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2001, revelaram que o aborto é a terceira causa de morte materna no Brasil. Mesmo diante dessa realidade, o país se mantém firme no que diz respeito a criminalização do aborto. “A bancada evangélica presta um grande desserviço ao aborto”, afirma a pesquisadora Greice Menezes, ao analisar o quanto políticos que compõe essa bancada tem intervindo contra o processo de legalização do aborto. O capelão do Hospital São Rafael localizado em Salvador, Bahia, Padre Bento Viana, apesar de ser contra o aborto, assim como prega a religião católica, afirma que o aborto não deveria ser crime. “Se as pessoas, sobretudos os católicos, já possuem uma consciência crítica sobre o ato de abortar, não o farão, mesmo não sendo crime perante à Lei”, avalia.

Apesar do país ser considerado um Estado Laico, os líderes religiosos têm conseguido sobrepor seus valores morais na política e com isso o aborto não é tratado como questão de saúde pública. Em maio deste ano, o Ministério da Saúde lançou uma portaria que regulamentava e estabelecia os procedimentos a serem realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) nos casos legais de aborto – gestação decorrente de estupro, gravidez de feto anencéfalo e risco de morte para a mãe. Dias após ser lançada, a portaria foi revogada por causa das pressões da bancada evangélica.

O pastor da Igreja Batista Sião, situada no bairro do Campo Grande, Walter Baptista, analisa que o aborto também é uma questão de educação. “Por que não trabalhar com os jovens para que eles só tenham relações sexuais depois do casamento? Seria uma forma de reduzir uma possível gravidez indesejada”, defende.

Aborto na Bahia

Atualmente os abortos legais na Bahia são realizados em dois locais, no Iperba (Instituto de Perinatologia da Bahia), que está habilitado e reconhecido pelo Ministério da Saúde e o Hospital Esaú Matos, em Vitória da Conquista. Segundo a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB), o projeto Superando Barreiras, que tem o objetivo de implantar o serviço de atendimento à mulher e adolescente vítima de violência sexual, pretende implementar o atendimento aos casos de aborto nas Maternidades Tysilla Balbino e Albert Sabin (Salvador), no Hospital João Batista Caribé (Salvador) e nos Hospitais gerais de Eunápolis e Barreiras, no interior do estado.

Segundo a Secretaria Estadual de Saúde da Bahia a média de abortos no estado tem sido de um por mês no IPERBA e um a cada 3 meses no Hospital Esaú. A faixa etária dessas mulheres é, em média, de 15 a 35 anos.

*Graduanda em Jornalismo e bolsista da Agência de Notícias C,T&I – Ciência e Cultura.

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