Falta transparência fiscal em Salvador e o descumprimento de diversas normas da lei de acesso a informação estão sendo comprovados através da pesquisa realizada pela jornalista Ana Carolina Araújo. Confira mais informações sobre o tema na entrevista realizada pela estudante Beatriz Bulhões para a Agência de Notícias - Ciência e Cultura
BEATRIZ BULHÕES*
biabulhoes@hotmail.com
Depois da lei de incentivo à informação, todas as prefeituras são obrigadas a mostrar ao cidadãos toda a sua movimentação fiscal. Mas Ana Carolina Araújo, Doutoranda em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo, decidiu pesquisar qual era o real impacto na vida das pessoas comuns. O estudo pretende estabelecer o nível de eficiência e transparência digital dos portais de transparência das capitais brasileiras e correlacionar os resultados a indicadores sociais e econômicos da população e do município. Uma de suas descobertas foi a de que a cidade em que morava é a capital menos transparente do Brasil.
Ciência e Cultura – O que te motivou a estudar os portais de transparência brasileiros?
Ana Carolina Araújo – Como jornalista que cobria politica, eu trabalhava muito em busca de informações que pudessem gerar pautas sobre a improbidade administrativa e comecei a observar como era difícil obter as informações que eu queria por esses portais dos municípios. Quando eu decidi fazer o mestrado, eu queria pesquisar essa área: como é que era o estado dessa transparência? Por que o que eu percebia era que as cidades tinham esses portais de transparência, mas que essa analise era muito complicada, achar essas informações era muito difícil. E se era difícil pra mim, que sou jornalista, imagina para o cidadão comum.
Ciência e Cultura – Antes você estudava moda. Como aconteceu essa mudança de área, com foco em pesquisa política?
Ana Carolina – Foi um processo meio longo. Eu trabalhava com moda antes de ter filho e, depois que eu tive filho, mudei varias coisas na minha vida. Mas, na verdade, eu não vejo uma ruptura. Hoje, por exemplo, eu faço doutorado, mas eu tenho uma marca na área de moda. Tenho um outro trabalho, por assim dizer, uma outra atividade. Então são duas coisas que eu gosto e que apesar de serem diferentes, dá para conciliar.
Ciência e Cultura – A implantação do portal da transparência trouxe impactos à vida do cidadão? Por exemplo, você acha que o cidadão passou a fiscalizar e cobrar mais dos órgãos públicos?
Ana Carolina – Houve sim mudança, claro. Isso gera, de qualquer forma, um acesso maior de toda a população de um país para os atos do governo, principalmente os atos fiscais. Mas em termos do cidadão médio, isso ainda deixa muito a desejar. Pois isso não é só questão de habilidade em acessar o site, o que a gente percebe hoje é que precisamos investigar se há interesse. Em muitos casos, eu poderia dizer a maioria, o cidadão médio não tem interesse nos temas da politica e, por consequente, nesse acesso ou nessa informação que está lá no portal.
Ciência e Cultura – Como você acha que o cidadão poderia participar mais desse processo?
Ana Carolina – Não é só o problema do acesso, por assim dizer. O que a gente percebe é que há uma falta de interesse das pessoas em se envolver com o tema politico. Isso é uma coisa que tem sido discutida na literatura política desde os anos 80. E o que parece é que ninguém sabe muito bem como é que você pode mobilizar a população para se interessar novamente. Existe de fato uma crise dessa democracia representativa e nós não sabemos muito bem como atuar em relação a isso. A minha opinião do que precisa acontecer é uma coisa bem primaria, é bem clichê também, mas você tem que incentivar a participação politica.
Ciência e Cultura – Você sentiu algum tipo de repressão por parte dos órgãos que estava investigando?
Ana Carolina – Eu não tive nenhum tipo de repressão nesse caso, porque o meu trabalho foi a investigação dos portais de transparência digital, sem contato direto com as pessoas. Eu trabalhei especificamente com essa ferramenta: os sites de municípios e sites de transparência. Agora, como jornalista buscando dados que deveriam estar disponíveis em portais de transparência, senti varias repressões. Já até recebi ligações de ameaça de autoridades de auto escalão.
Ciência e Cultura – Após sua pesquisa, quais suas conclusões sobre Salvador e as demais cidades da Bahia?
Ana Carolina – Dentro da minha pesquisa, Salvador foi a capital menos transparente do país todo. O site da prefeitura de Salvador sequer tem uma referência em relação ao portal de transparência. Não existe publicação de receitas em temo real e não são cumpridas muitas regras da legislação de transparência e abertura da lei de acesso à informação. Mais do que ser a pior: como a minha pesquisa faz um corte longitudinal, comparando com a mesma metodologia usada em 2001, percebe-se que salvador caiu. Salvador era a 17ª capital menos transparente e hoje é a ultima. Então, se já era ruim, hoje é ainda pior.
* Estudante de graduação em Comunicação Social – Jornalismo na Faculdade de Comunicação da UFBA