O professor de psicologia da UFBA, mestre em Linguística e doutor em Educação, Jorge Luiz Lordêlo Sales Ribeiro, fala sobre o importante e complexo processo de Avaliação Institucional nas universidades brasileiras, em especial na Universidade Federal da Bahia
MARINA ARAGÃO*
marinaaragaosilva@gmail.com
A Avaliação Institucional é um instrumento importante para o desenvolvimento das universidades no país. Esse processo permite uma reestruturação do processo educacional e tem como objetivos corrigir, regularizar e aprimorar os aspectos avaliados dentro das instituições. Entretanto, ainda é um assunto pouco difundido, como também rodeado de intensas controvérsias. Em entrevista para a Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura, o psicólogo e especialista no assunto, Jorge Luiz Lordêlo Sales Ribeiro, explica o funcionamento e esclarece as polêmicas geradas em torno da Avaliação Institucional.
Ciência e Cultura – Qual é a importância e a função da Avaliação Institucional para a universidade?
Jorge Sales Ribeiro – A avaliação é uma área que sempre produziu muita polêmica porque existe uma desconfiança histórica entre governo e universidade. Há uma reação muito forte tanto de estudantes como de professores no que se refere às tentativas de avaliação. Temos visto cada vez mais a necessidade de fazê-la, primeiro por tentativa de controle do governo federal. Mas além disso, tem-se destacado agora a importância da avaliação para o desenvolvimento da instituição.
A partir de 2004 se implantou o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), e o enfoque dado a avaliação é sempre o desenvolvimento da instituição. Hoje a educação é um grande mercado e percebe-se cada vez mais uma competitividade entre as instituições. E aí está a importância da avaliação, tanto para a regulação do sistema como também para o aprimoramento da instituição para torná-la mais qualificada.
Ciência e Cultura – Como funcionam as duas perspectivas da avaliação?
Jorge Sales Ribeiro- Uma concepção relaciona-se com a regulação do sistema, ou seja, ao se abrir um novo curso ou uma nova instituição é preciso que se tenha uma autorização do governo que permita a abertura. Depois de criado, existe um período para ser reconhecido. Se o projeto foi efetivamente cumprido, tem-se o reconhecimento desse curso para qualificar pessoas, graduar, emitir certificados, diplomas etc. Feito isso, a cada três anos, esse reconhecimento do curso é renovado, para verificar se há condições de o curso se manter no sistema ou não.
O outro tipo é o aprimoramento. Essa é uma avaliação que se faz no sentido de proporcionar a universidade meios de verificação dos padrões mínimos de qualidade e fazer com que ela alcance esses padrões ou até os supere. Hoje são duas avaliações bem distintas. Uma de caráter regulatório e outra para a promoção da qualidade.
Mas o eixo dessa avaliação institucional é a autoavaliação. A cada ano é necessário fazer um relatório da instituição. E com base nesse relatório, a instituição depois é avaliada por uma comissão externa do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). A comissão compara o seu relatório com a autoavaliação e estabelece um protocolo de ajustes ou simplesmente credencia e renova a universidade.
Agência de Notícias Ciência e Cultura – Quais são as etapas desse sistema de avaliação?
Jorge Sales Ribeiro - A primeira é a avaliação dos estudantes, o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE). Há uma parte de alunos que são ingressantes no curso e uma parte de alunos que são concluintes. A unidade os inscreve e eles são chamados para fazer o exame. Isso acontece a cada três anos em cada curso.
O ENADE produz uma média de desempenho dos estudantes daquele curso. Se for igual ou superior a 3, esse curso é entendido como de qualidade, dispensando a avaliação externa. Essa média, Conceito Preliminar do Curso (CPC), vira uma conceito do curso e é apresentada para a instituição. O coordenador da unidade recebe, examina, e se concordar, esse conceito preliminar vira o conceito do curso.
O outro elemento é a avaliação externa. O curso que obteve um ENADE insuficiente faz essa avaliação. Uma equipe do Ministério da Educação (MEC), durante um período, vai à instituição e faz a avaliação do curso. Depois, produz um relatório e emite um novo conceito.
E o terceiro componente no sistema é a avaliação da instituição. Existe uma comissão que a cada cinco anos vem à universidade e avalia toda a instituição e os cursos de forma geral. Isso também emite um conceito de 1 a 5 que é o IGC (Índice Geral de Curso).
Ciência e Cultura - Há algumas críticas quanto à superficialidade do ENADE ou até mesmo à própria negligência dos alunos ao fazerem a prova. Como você avalia isso?
Jorge Sales Ribeiro – Todo sistema de avaliação recebe muitas críticas. O ENADE foi um avanço. Esse exame veio substituir o Exame Nacional dos Cursos (ENC), o antigo provão. O provão era um exame muito mais criticável do que o ENADE. Ele estabelecia apenas uma nota e todos os alunos do curso faziam.
O ENADE é um exame que recai todo sobre a boa vontade do aluno, apesar de haver uma obrigatoriedade para a formação. Então é necessário que se faça uma sensibilização com os alunos, mostre a importância e o significado dele. A intenção é verificar realmente se aquele curso vale a pena ou não. Porque, com base nos resultados, é possível fazer correções no currículo, ajustes, uma série de coisas para melhorá-lo.
Ao boicotar a prova, o aluno produz uma visão falsa do curso, acarretando em dois problemas: primeiro, atribui-se uma imagem negativa à instituição. Os resultados obtidos fazem parte da matriz orçamentária da universidade. Aquela universidade que tem bons desempenhos termina ganhando mais recursos. Se o desempenho cai, o recurso diminui. Segundo que isso pode causar uma distorção no curso. A unidade pode se debruçar sobre os resultados e concluir que há a necessidade de se fazer uma reforma curricular geral. Mas chega-se a esse nível em cima de uma opinião absolutamente falsa. Por isso, essa é uma questão que precisa ser divulgada e muito conversada para que o aluno entenda o que é, pois ele estará ajudando a construir a universidade com a qualidade merecida.
Ciência e Cultura – Quanto às suas pesquisas, elas conseguiram desenvolver ou melhorar alguns desses métodos de avaliação que são utilizados, ou desenvolver algo diferente?
Jorge Sales Ribeiro – Sim. O próprio ENADE já é um desenvolvimento fantástico do provão. Mas ela não é o ideal. O MEC aponta agora para a colocação da nota do ENADE no histórico do aluno ou que essa nota seja utilizada como modo de ingresso na pós-graduação, e isso é um avanço. Ou seja, alguma consequência tem que ser produzida para que o estudante se sinta mais comprometido.
Então os avanços são assim mesmo, são pequenos. Mas os avanços dentro da universidade são enormes. Aqui na UFBA, a PROGRAD está fazendo um seminário de avaliação de cursos, em que se apresenta o modelo pretendido para a instituição. A cada seminário, a PROGRAD convida dois cursos para falar da sua experiência com a avaliação.
Ciência e Cultura – Nessa autoavaliação os professores são avaliados individualmente?
Jorge Sales Ribeiro: Sim. As universidades têm autonomia para fazerem a autoavaliação como bem entendem. No nosso caso, temos dificuldade para fazer a autoavaliação porque não conseguimos avaliar a universidade como realmente deveria. Temos uma feita pelo SIAV, no momento da matrícula, que é a avaliação do desempenho do docente pelo discente. Mas o desempenho do professor não resume a avaliação do curso, então precisamos avaliar bibliografia, bibliotecas etc. Esse tipo de avaliação que nós fazemos hoje nos dá uma medida ainda muito global. Precisamos fazer medidas que permitam intervenções mais pontuais e mais rápidas sobre a estrutura institucional.
Além dessa avaliação, existem as avaliações que fazemos de um modo indireto, através dos relatórios de gestão. Alimentamos uma série de dados através desse relatórios e fazemos uma avaliação mais global da universidade. Mas como precisávamos fazer algo mais específico, agora no SIAV há a possibilidade do professor se autoavaliar. Esse ano, provavelmente, nós implementaremos a possibilidade do aluno avaliar o professor, do professor se autoavaliar e avaliar a turma, e do coordenador do curso também avaliar.
Ciência e Cultura – Há alguma avaliação específica no que se refere a mestrado e doutorado?
Jorge Sales Ribeiro – Sim. A pós-graduação tem um modo de avaliar que já é consagrado no Brasil e produziu efeitos muito importantes, o modelo da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). O SINAES, inclusive, utiliza dados da CAPES para compor a nota da universidade. Mas a pós-graduação tem uma avaliação bem específica. Essa é muito menos questionada pois já tem muitos anos e é um sistema bem consolidado. A pós-graduação é mais fácil de avaliar pois possui um produto, que é a dissertação. Mas o produto da graduação não é tão claro quanto o da pós. Como é que se vai avaliar o impacto que a graduação produziu na vida do aluno? É muito mais complicado, não só pela quantidade, mas porque não há como mensurar.
* Estudante de graduação em Comunicação Social – Jornalismo na Faculdade de Comunicação da UFBA.