O tratamento dados pelos jornalista à presidenta Dilma Rousseff, considerada desrespeitosa pelas debatedoras, foi o tema central do evento
BEATRIZ BULHÕES*
biabulhoesssi@gmail.com
Na segunda-feira, 18, após o resultado da votação que aprovou, na Câmara dos Deputados, o prosseguimento do processo do impeachment da primeira presidenta mulher do Brasil, mulheres se reuniram no salão nobre da reitoria da Universidade Federal da Bahia (UFBA) para debater mídia, empoderamento e, claro, democracia. Ao som de cantoras como Beyoncé e Mart’nália , a decoração também homenageava o “sexo frágil”: fotografias de ícones como Maria Quitéria e Simone de Beauvoir ao lado de cartazes com leis importantes como a Lei Maria da Penha. Na plateia, de mais de 200 pessoas, a maioria das cadeiras era ocupada por mulheres.
Na mesa, mulheres também com importante representatividade no cenário nacional: a Secretária Estadual de Política para as mulheres da Bahia (SPM-BA) e presidenta do Conselho Estadual de Defesa Contra os Direitos da Mulher (CDDM), Olivia Santana; a jornalista e professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Nadja Vladi; a médica e articulista do portal Gueledés, Fátima Oliveira; a mestra em direito público e professora da UFBA, Daniela Portugal; a coordenadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM), Rosângela Araújo; e a professora de literatura. A psicologa e Pró-Reitora de Relações Afirmativas de Assistência Estudantil da UFBA (PROAE), Cassia Maciel, ministrou o debate.
Em comum, além do fato de ser mulher, entre as participantes, apenas o desgosto com o atual cenário político. “Dilma cai enquanto gênero, enquanto mulher”, comenta Anna. A jornalista Nadja Vladi fez questão de nomear Dilma Rousseff do modo que ela prefere: presidenta, com “a” no final. Vladi questiona o porquê o jornalismo brasileiro ainda insiste em chamar a presidenta de “a presidente”. “Nunca tivemos uma mulher presidente, apenas de algumas poucas empresas, então nunca havíamos precisado de uma flexão da palavra para o feminino, mas agora é um ato politico.”
De acordo com Fátima Oliveira, a situação política do país é causada pelos ataques a presidência, insinuando que uma mulher não conseguiria governar um país. “Fazem com Dilma o que não teriam coragem de fazer jamais com nenhum macho. Tudo isso é um impedimento concreto ao empoderamento das mulheres”, conclui. Rosângela Araújo acredita que as mulheres são chamadas o tempo todo a ir para a cena pública defender as mulheres, “ainda mais nesse segundo mandato da presidenta”, afirma.
Mídia - A matéria de capa da revista Época, na qual apresentou a presidenta Dilma como histérica, ilustrada com uma foto dela comemorando um gol do Brasil na Copa, foi o assunto trazido para a discussão e que relacionou os três temas do debate: Mídia, Democracia e Mulher. Olívia Santana lembrou também que uma das autoras do impeachment, a jurista Janaína Paschoal foi chamada de histérica após divulgado um vídeo em que se exalta ao defender seu ponto de vista. “Uma mulher exaltada é sempre vista ou como louca, ou como máscula”, concluiu Olívia.
Ela ressalta ainda que o prefeito de Salvador não tem primeira dama. ACM Neto foi casado, mas separou-se em 2012. “Alguém vê esse fato ser tematizado na mídia, como elemento desqualificante de sua habilidade de governar? Muito pelo contrário. Então por que Dilma tem que ser examinada nessas dimensões?”, questiona Olívia.
Nadja Vladi, representante do jornalismo, concordou: “Sou jornalista e sei muito bem como as mulheres são tratadas em um jornal, tanto nas redações como nas notícias. Tanto como tratam, como quando não tratam”.
De acordo com a advogada Daniela Portugal houve um avanço na legislação, com relação às punições de crimes contra as mulheres mais, ainda assim, “o direito penal é o direito menos feminino dos direitos”. A advogada afirma ainda que, até a década de 40, um marido forçar a mulher a ter relações sexuais, não era considerado como um crime contra a mulher, mas hoje em dia é considerado estupro. “Os autores de direito penal, inclusive, explicavam que se o marido se valesse de ‘moderada’ violência, não haveria crime por se tratar de exercício regular de um direito”, lembra ela.
Outro aspecto abordado na lei era a questão do abuso praticado em prostitutas. “Como até 2009 o estupro era um crime de honra, contra os costumes, e acreditava-se que prostitutas não tinham honra, não seria considerado estupro”, explica. Já para as mulheres que não eram profissionais do sexo, a única solução era casar- se com o agressor ou com qualquer outro homem e o estuprador estava livre de ser julgado. Com o tempo, a legislação mudou para que o estuprador fosse liberado de sua punição caso se casasse com sua vítima, e isso só foi mudado em 2005.
*Graduanda do curso de jornalismo da Faculdade de Comunicação e estagiária da Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura Ufba