A compreensão da assexualidade ainda é cercada de dúvidas e discussões. A psicóloga especialista em psicoterapia com foco em sexualidade, Violeta Campos Ribeiro, em entrevista à Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura, falou um pouco sobre a assexualidade, mostrando que esse é um comportamento normal e que não está associado a distúrbios, mas que ainda é rodeado de desconhecimento e difícil aceitação na sociedade
LUCAS BRANDÃO*
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Ciência e Cultura – Qual a melhor forma de definir a assexualidade?
Violeta - O conceito de assexualidade ainda está em construção, mas uma das definições é ‘uma forma de expressão da sexualidade humana caracterizada pela ausência de atração sexual e/ou desejo’, ou seja, quando a pessoa não sente atração ou desejo sexual nem por homens nem por mulheres.
Ciência e Cultura – A assexualidade pode causar transtornos?
Violeta - Não, a não ser que o indivíduo esteja com dificuldade de aceitar a sua própria condição de assexual. Se a ausência de atração ou desejo não lhe causa nenhum desconforto, provavelmente não será um transtorno. No entanto, se não for bem aceita, poderá desencadear processos ansiosos ou depressivos.
Ciência e Cultura – Um assexual pode ter um relacionamento saudável e duradouro?
Violeta – Sim. Da mesma forma que é possível realizar atividades sexuais sem amar a parceria, é possível amar a parceria e não querer realizar atividades sexuais. Muitos assexuais afirmam já terem vivido relacionamentos afetivos ou amorosos duradouros, porém sem a prática de atividades sexuais.
Ciência e Cultura – Existem várias “classificações” para os assexuais, como os heterorromânticos, que se interessam pelo sexo oposto, e os homorromânticos, que se interessam por pessoas do mesmo sexo. Como explicar isso?
Violeta – Estas classificações dizem respeito aos sentimentos de afeto que indivíduos assexuais podem sentir por alguém, diferentes da amizade ou da admiração. São semelhantes aos conceitos de heterossexualidade, homossexualidade e bissexualidade, em que o desejo sexual se orienta para pessoas do sexo oposto, do mesmo sexo ou ambos. No caso dos assexuais, o afeto ou interesse romântico também pode se dirigir a pessoas do sexo oposto (heterorromânticos), do mesmo sexo (homorromânticos) ou para ambos (birromânticos) mesmo que não haja contatos sexuais. Existem ainda assexuais que não expressam interesse por relações amorosas de nenhuma forma, os chamados arromânticos.
Ciência e Cultura – Existe algum fator genético que determine que um indivíduo é assexual?
Violeta – A sexualidade humana não é uma questão de opção individual, ela é inerente à nossa condição. Assim como dizemos que pessoas nascem heterossexuais ou homossexuais, é possível dizer também que pessoas nascem assexuais. O entorno psicossocial também exerce uma influência importante sobre as possibilidades de expressão da sexualidade, mas devemos reconhecer e aceitar a riqueza da diversidade sexual de nossa espécie, da qual a assexualidade também faz parte.
Ciência e Cultura – Como diferenciar a assexualidade de alguma patologia ou distúrbio?
Violeta – Se compreendermos a assexualidade como uma das possibilidades de expressão da sexualidade humana, ela não deverá então ser caracterizada como distúrbio ou patologia. Não devemos confundir a assexualidade com a diminuição de desejo, por exemplo, que é uma disfunção sexual em que a pessoa deixa de sentir desejo sexual e isso causa desconforto. A diminuição de desejo pode ocorrer devido a fatores hormonais ou psicológicos, já o indivíduo assexual geralmente apresenta suas taxas hormonais normais e aceitação da sua própria sexualidade. Há ainda distúrbios psicológicos que podem causar impactos na vida sexual e requerem tratamento médico e psicológico, mas não têm relação nenhuma com assexualidade.
Ciência e Cultura – Há alguns relatos de assexuais com tendência a depressão. Como evitar isso?
Violeta – Possivelmente essas pessoas devem estar enfrentando dificuldades de compreender a expressão da sua sexualidade e estão sofrendo por isso. Nestes casos, a melhor forma de evitar um processo depressivo é buscando o autoconhecimento. Os processos de psicoterapia podem ser uma boa alternativa para conhecer e compreender a sua forma de ser no mundo.
Ciência e Cultura – Qual o papel da escola e da família nas experiências dessas pessoas?
Violeta – Se tomarmos por base que o comportamento caracterizado pela prática sexual é o comumente aceito pela sociedade, provavelmente pessoas assexuais sejam alvo de preconceito, discriminação, desconfiança e até mesmo violência. Assim, a escola e a família têm papel fundamental no acolhimento dessas pessoas e da sua forma de ser. É preciso compreender a assexualidade como uma expressão da diversidade sexual humana, considerando que não se consiste em um problema. O respeito à individualidade do outro proporcionará uma experiência mais saudável e plena da sexualidade.
Ciência e Cultura – Qual a diferença entre atração sexual e desejo sexual?
Violeta – A atração sexual é composta por um conjunto de características que motivam as pessoas a se aproximarem umas das outras. Atributos físicos, características pessoais e fatores sociais podem contribuir para a aproximação ou não das pessoas. Já o desejo sexual é a vontade de realizar atividades sexuais com as pessoas pelas quais se sente atração.
*Graduando do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Faculdade de Comunicação da UFBA e estagiário da Agência de Notícias em CT & I – Ciência e Cultura