Em tempos de Olimpíadas e Paralimpíadas, o primeiro curso público de Educação Física na Bahia, não prepara uma base esportiva para o país e enfrenta falta de visibilidade e muitos desafios
POR LUCAS GAMA E NATÁCIA GUIMARÃES*
lucasgama@gmail.com / guimaraesnatt@gmail.com
O curso de Educação Física da UFBA, fundado em 1988, foi o primeiro curso público desta modalidade no Estado da Bahia e é uma licenciatura alocada na Faculdade de Educação da UFBA (Faced). As divergências entre a grade curricular do curso, as disciplinas e a falta de estruturas para a prática física estão constantemente em pauta.
O curso, por fazer parte da Faced, tem seu espaço central ocupado por uma ótica teórica, principalmente na forma como são conduzidas as pesquisas e a graduação, que é voltada para a formação de professores, onde “o trato do conhecimento aponta para as questões pedagógicas do campo escolar”, afirma o professor e coordenador do colegiado do curso, Romilson Augusto dos Santos.
“[O curso de] educação física”, explica o professor, “tem um trato pedagógico onde as manifestações dos jogos, do esporte, das lutas e das danças se configuram como conteúdo para as aulas de educação física na escola”. Por sua vez, os princípios da educação, como prática social, regem o curso, a pesquisa e a forma como lidar com o conhecimento. Dessa maneira, pensa-se e ensina o esporte como algo que auxilia na formação do indivíduo, como uma possibilidade para a vida e como algo que se cultiva, em que se prezam os movimentos e sua história ao invés de dar maior prioridade para a busca em ser o melhor.
“Do ponto de vista pedagógico, o curso dá ênfase na busca da autonomia do sujeito, por ter muitas disciplinas vinculadas às questões da formação humana.”, aponta Romilson, que tem 26 anos na casa, (dos 28 existentes do curso). “Não quer dizer com isso que a gente não discuta o rendimento, mas não é a prioridade do curso”, reitera.
A nova grade curricular, em vigência desde 2011, é um dos pontos de conflitos existentes no curso. Jonatas Souza, estudante do 5º semestre e membro do Diretório Acadêmico (DA) de Educação Física, afirma que a grade, como de qualquer curso, têm carências e ainda precisa ser aperfeiçoada. “Se por um lado a nossa [grade curricular] abraça todos os espaços formativos da educação física, por outros, ela deixa de atender algumas especificidades. Algumas disciplinas têm carga horária que são demasiadamente exageradas e não tão produtivas, enquanto outras mereciam um tempo maior.”
Em entrevista publicada no dia 8 de Agosto de 2016, pela Agência de Notícias em Ciência, Tecnologia e Inovação, o professor do curso Fernando Espirito Santos falou sobre as carências da grade: “Fala-se de teoria do esporte, política pública de esporte, fazendo uma série de leituras, porém os estudantes deixam de conhecer os fundamentos técnicos desse esporte. Alguns professores perderam a mão nesse sentido e os alunos estão sofrendo as consequências. Formou-se uma geração com menos capacidade técnica.”, afirma Santos.
Confira a entrevista na íntegra!
Na época em que o curso foi fundado, o vínculo com a Faculdade de Educação era uma das formas de não deixar o curso com uma mentalidade “estreita” ou militarista como era visto no curso da Universidade Católica, criada anos antes. Também é importante dizer que essa ênfase dada à educação e à formação de professores seria diferente se o curso de Educação Física estivesse acoplado, por exemplo, à área da Saúde, como acontece em diversas universidades do país.
Hoje em dia, no entanto, é questionado a existência do curso atrelado à Faced. Discute-se a criação do Instituto de Educação Física para assegurar de maior autonomia. Nas eleições para o DA, essa foi uma das propostas da chapa “Há quem sambe diferente”, chapa vencedora e única candidata. Outro ponto proposto pela chapa e defendido entre docentes e discentes é modificações na grade curricular, para agregar disciplinas que integram outras áreas da Universidade, como anatomia e fisiologia, assim como por disciplinas com um caráter mais técnico, como primeiro socorros e medidas de avaliação física.
Em 2011, as aulas do curso de educação física, que antes aconteciam exclusivamente na Faced, passaram a acontecer, simultaneamente, no Centro de Educação Física e Esporte da UFBA (CEFE), situado no campus de Ondina. Ao passar para o CEFE, o curso garante uma maior autonomia, contudo as estruturas são precárias. O Centro conta com duas salas de aula, quadras poliesportivas e um campo, onde alunos da universidade e da comunidade podem usar. Ao todo, cerca de 2 mil pessoas cadastradas utilizam o espaço todo mês.
Apesar do espaço privilegiado, a falta de estrutura tornou o CEFE um espaço de pouco aproveitamento pelos alunos. As quadras quebradas, as traves enferrujadas são pontos externos que demonstram a carência do espaço. “Me sinto como se estivesse em um grande faz de contas. Quando estou no CEFE me sinto indignada ao saber que a UFBA oferece um curso de Educação Física e tem um Centro de esporte tão decadente” analisa Kamile Rabelo, aluna do sexto semestre do curso. A estrutura “capenga” do espaço impossibilita que o centro se torne um espaço de uso comunitário por alunos que buscam uma formação mais prática no curso.
Leia nossa reportagem sobre os projetos oferecidos para a comunidade em torno do CEFE
O Brasil termina de sediar as olimpíadas Rio 2016 e se prepara para as paralimpíadas. O placar de medalhas do país nos jogos olímpicos, com o recorde de 19 medalhas que nos levou ao 13º lugar, mesmo sendo nosso o melhor resultado, exige uma reflexão sobre a importância que a sociedade, como um todo, dá ao esporte – principalmente se pensarmos que a Grã-Bretanha, que não chega a somar 65 milhões de habitantes, assumiu o segundo lugar com um total de 67 medalhas . O Ministério do Esporte criou, em 2005, uma bolsa-atleta que auxilia os atletas de alto rendimento para que possam treinar para competições como Pan Americanos e Olimpíadas em tempo integral sem preocupações financeiras. A falta de estrutura física em muitas cidades, no entanto, é uma dura realidade. Será que o Centro de esportes da UFBA, um instituto federal, não poderia ser um ponto de referencial para treinamento dos atletas baianos?
*Estudantes da Faculdade de Comunicação da UFBA e estagiários da Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura