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Ciência e Cultura - Agência de notícias da Bahia
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Atualizado em 7 DE outubro DE 2016 ás 17:37

Mariluce Moura

A história de Mariluce Moura com a pesquisa científica vem desde 1988 e perdura até hoje. Seu nome está ligado à maior revista de produção científica do país, a Revista Pesquisa Fapesp, da qual foi editora-chefe até meados de 2014, quando decidiu dar prosseguimento a um sonho antigo: popularizar a ciência e a pesquisa científica. Foi assim que surgiu o projeto Ciência na Rua, que, de forma bem humorada, aborda a ciência e possibilita o seu entendimento por crianças e adolescentes

POR YASMIM GARRIDO REIS BRANDÃO*
yasmingarrido33@gmail.com

Ciência e Cultura – Qual a sua história com o jornalismo? Quando você decidiu pela graduação na área de comunicação?

Mariluce Moura – Eu decidi no terceiro colegial, já em maio. Ia fazer vestibular para medicina no final do ano e, em maio, mudei do curso científico para o clássico. Eu tinha ficado procurando uma profissão que refletisse tudo aquilo que gostava de fazer. E já não queria mais fazer medicina, porque estava preocupada de ficar muito deprimida de ter que lidar com doentes. Eu não tinha muita consciência de que poderia fazer uma carreira de pesquisadora na medicina. Só pensava na prática médica mesmo. Como eu queria fazer psiquiatria, neurologia, achei que fosse ficar deprimida. Aí, decidi fazer jornalismo, porque juntaria o meu gosto por escrever, pelas humanidades e, ao mesmo tempo, o gosto pelas ciências. Achava que, sendo jornalista, poderia tratar de qualquer dos temas. O pessoal do Colégio Aplicação, onde eu estudava desde 1962, no início do ginásio, achou um absurdo, porque considerava que gente inteligente não deveria fazer jornalismo. Meus pais ficaram espantados, mas não me impediram. Eu fiz o vestibular para jornalismo e passei bem, acho que em primeiro lugar. Em julho de 1969, comecei a trabalhar como jornalista, pois fui fazer um estágio com o redator chefe do Jornal da Bahia, que era meu professor na faculdade, e, ao final, me perguntaram se eu gostaria de ficar e eu aceitei. A faculdade era à tarde e eu trabalhava pela manhã no jornal. Esse foi o meu início de carreira.

Ciência e Cultura – Como o jornalismo científico surgiu em sua vida?

Mariluce Moura – O jornalismo científico surgiu muito depois do meu ingresso no jornalismo. Como todo mundo, eu fiz o chamado jornalismo geral, de cobrir buraco de rua, enchente, chuva, cultura e espetáculos culturais. Depois, no período que a ditadura endureceu, de 1970 em diante, decidi fazer jornalismo econômico, porque a área de economia era a que menos sofria censura nos jornais. Eu diria que, a partir de 1972, já me inclinei bastante para o jornalismo econômico e fiquei nele até 1988. Fui coordenadora de economia do Jornal do Brasil, em Brasília, trabalhei aqui em Salvador, no Rio de Janeiro, em Brasília e, em 1988, o superintendente de comunicação do CNPq me convidou para trabalhar com ele, como assessora de comunicação. Eu já estava de saco cheio de economia e, nessa época, estava atuando na UNICEF, como assessora. Com esse convite do CNPq eu realmente engrenei e nunca mais saí de jornalismo científico. Para mim, foi o momento de juntar aquelas coisas todas que eu gostava de ciências, em particular das biológicas e das ciências da saúde, com o jornalismo. Foi uma mudança legal.

Ciência e Cultura – Qual a sua história no jornalismo científico?

Mariluce Moura – No jornalismo científico, comecei no CNPq, atuando como assessora de comunicação e depois como editora-chefe da Revista Brasileira de Tecnologia, em 1989. Com isso, eu mudei para São Paulo, montei uma redação e, quando veio o Plano Collor, toda a verba destinada a esse setor no CNPq foi cortada, sendo suspensa a publicação da Revista Brasileira de Tecnologia, que tinha 25.000 exemplares, cada um com 72 páginas, mais ou menos. Era uma revista madura e eu fiz a reforma do projeto editorial a pedido do CNPq, implantei essa redação e, quando veio essa coisa do terror do governo Collor, o CNPq decidiu suspender a revista, a equipe toda foi demitida e eu fui para a Gazeta Mercantil implantar a editoria de tecnologia. Fiquei lá de 1990 até 1994, quando fui para a Secretaria de Ciência e Tecnologia de São Paulo. Lá, reencontrei o pessoal da Fapesp, que eu já conhecia, pois havia feito matérias na Gazeta Mercantil sobre alguns projetos que eles apoiavam em São Paulo, e fui convidada para montar uma assessoria de comunicação na Fapesp. Montei a assessoria a partir de abril de 1995, fiz o primeiro boletim de notícias, que se chamou Notícias Fapesp, em agosto de 1995. As coisas foram crescendo e, em outubro de 1999, a gente conseguiu transformar o boletim em uma revista mensal. Apresentei o projeto, que foi discutido no Conselho Superior da Fapesp, e foi assim que teve início da Revista Pesquisa Fapesp. No começo de 2002, a revista passou a ser vendida em banca e a permitir assinaturas para todo o Brasil. Minha história com a Fapesp durou 20 anos. No final de 2014, eu queria sair, pois tinha planos de fazer o projeto Ciência na Rua, um projeto mais voltado para o público jovem, não tão bem formado como era o público da Revista Pesquisa Fapesp. Como já tinha uma equipe grande e madura, que poderia tocar o projeto na Fapesp sem mim, eu decidi fazer essa aventura.

Ciência e Cultura – Como foi pensado o projeto Ciência na Rua e quais foram os seus parceiros e apoiadores para o projeto?

Mariluce Moura – Isso tem uma história longa. Eu achava que o Ciência na Rua deveria ter o apoio do CNPq, da FINEP e de várias agências de financiamento. Só que, já em 2014, começaram a anunciar a crise e, dentro do CNPq, o projeto não conseguiu ser aprovado como projeto especial de divulgação científica. A gente ficou sem o dinheiro do CNPq, depois sem os recursos da FINEP. Eu resisti um tempo, até que resolvi, no final do ano passado, lançar o projeto mesmo sem recursos. Precisava apenas de R$ 100.000,00 para pagar, durante o ano, os salários de um programador, de um jornalista e o aluguel do espaço onde a gente se abrigava. Comecei a fazer o Ciência na Rua em janeiro deste ano, apenas com a ajuda do programador. Quando fiz o projeto Ciência na Rua, a ideia era que a parte de pesquisa fosse feita no Labjor, na Unicamp, porque, quando eu saí da Fapesp, voltei a ser pesquisadora e colaboradora do Labjor. O projeto se propunha desde o começo a ter um caráter de mídia cruzada e que, de fato, levasse a ciência com humor para a rua. Mas, no meio da crise a gente vai se adaptando. Então, o único apoiador do projeto é o BIOTA, da Fapesp, um programa de pesquisa e preservação de biodiversidade, que tem a mesma idade da Revista Pesquisa Fapesp. O coordenador desse programa achou que era bom apoiar o Ciência na Rua para difundir mais os temas da biodiversidade. Foi assim que a gente materializou a primeira parte do projeto e sua fase inicial.

Ciência e Cultura – Qual a importância do Ciência na Rua para a popularização da ciência?

Mariluce Moura – Eu quero que ela seja importante. A população alvo do projeto é formada por 30 milhões de brasileiros. Eu acho que, se o Ciência na Rua conseguisse crescer em dez anos, para falar através de várias atividades, em parceria com muita gente, com múltiplas atividades de rua, atingindo, por ano, um milhão de pessoas, já estava de bom tamanho para fecundar algumas simpatias e interesses pela cultura científica, pela ideia de que ciência é também um campo importante para você desenvolver  a cidadania, porque entra em sua vida e em seu cotidiano e, se você não tiver algum conhecimento sobre a produção científica, você fica alienado de um dos pilares da cultura contemporânea. Eu acho que o Ciência na Rua tem importância, ainda que pequena, pois é uma iniciativa que está restrita e iniciando agora, mas a ideia é que cresça e tenha efetivamente importância. A Revista Pesquisa Fapesp se transformou na referência nacional de pesquisa de divulgação científica e eu tenho um enorme orgulho disso. Eu gostaria que, dentro de 10 anos, não menos, o Ciência na Rua fosse uma referência de fazer popularização da ciência misturando muitas ferramentas e instrumentos, mas sempre tendo um olhar de humor, lúdico, com prazer, sem chatice para os temas científicos.

Ciência e Cultura – Qual a dificuldade de tratar de temas científicos com humor?

Mariluce Moura – O Ciência na Rua começou tendo como ideia principal consegui fazer divulgação de jornalismo científico com humor. Mas, eu gostaria de ter muito mais charges, muito mais filmes e rádios engraçados. Só que charge, por exemplo, tem um custo alto e o projeto tem muito de voluntariado. As duas pessoas que fazem o podcast Ciência no Elevador, com a Dona Claudine, por exemplo, o fazem gratuitamente. Os vídeos das adolescentes, Cientisteen, também é trabalho voluntário. Temos um pequeno vídeo de apresentação, que a gente já colocou no Facebook, e artigos de pesquisadores, feitos em linguagem simples, tudo de maneira voluntária. Com exceção de uma repórter, que trabalha lá em São Paulo, todo mundo escreve de graça. Porém, não dá para pedir charge de graça para um chargista. É complicado. Por isso, falta ainda uma parte de humor que precisa ter recursos para poder gerar.

Ciência e Cultura – Já existem planos de o Ciência na Rua existir para além das plataformas digitais?

Mariluce Moura – Por enquanto, nós temos o site, o Facebook e o Twitter. Eu estou querendo, a partir de dezembro, tornar ativo o Instagram, que já foi criado, mas não tem muitas postagens, porque a atual repórter fica muito presa ao Facebook. A ideia é que entre por todas as plataformas digitais e que ganhe o espaço físico também. Agora em outubro, vem uma segunda iníciativa ligada ao Ciência na Rua. A gente vai iniciar uma exposição chamada jogos de luz, para crianças de 7 a 10 anos, que nada mais é do que experimentos, brinquedos que as crianças podem manipular e que permitem uma noção da natureza e do movimento das luzes. Junto com a exposição presencial, a gente vai criar uma exposição virtual, para ela poder ficar abrigada em uma área específica do Ciência na Rua. Isso vai ser inaugurado no dia 17 de outubro, quando abre a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, lá em Campinas, no Parque do Taquaral, dentro de um museu, num parque público. A exposição vai ficar três meses lá. Depois tem que ir para São Paulo e a gente ainda está definindo se vai ser em parceria com um dos SESC’s da capital. A minha ideia é que a gente possa trazer a exposição para a Ufba, dentro dessa itinerância que a ela possui, como proposta para as crianças se familiarizarem com a ciência. E isso tem tudo a ver com o espírito do Ciência na Rua. Vamos fazer essa exposição, pois ganhamos o recurso de um edital do CNPq com o instituto TIM no final do ano passado. A gente apresentou o projeto, eu estava como pesquisadora do Labjor e como editora do Ciência na Rua, e conseguimos esse apoio.

*Estudante de graduação em Comunicação Social – Jornalismo da Faculdade de Comunicação da Ufba

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