É cada vez mais crescente o número de mulheres que preferem o parto humanizado. De acordo com a fisioterapeuta Aline Manta da Silva, especialista em saúde da mulher, o grande desafio é ampliar o conhecimento sobre a prática tema e ter mais hospitais especializados que dêem conta da demanda na Bahia
POR AMANDA DULTRA*
etherealfay@gmail.com
Ciência e Cultura: Quando iniciou a atuação em saúde da mulher? Qual o motivo de escolher essa área?
Aline da Silva: Eu não comecei diretamente na obstetrícia, mas na área da uroginecologia, na fisioterapia da saúde da mulher, algo mais segmentado, só depois parti para a área de parto. A mulher tem uma série de particularidades e uma delas é a gestação, a qual requer atenções especiais, então é um campo bem amplo ao tratar a paciente por inteiro. E é isso que me interessa: a abrangência para tratar da mulher.
Ciência e Cultura: A relação entre fisioterapia e partos trata-se de um campo relativamente novo?
Aline da Silva: A área de saúde da mulher como um todo é uma especialidade reconhecida recentemente. Foi normatizada pelo Ministério da Saúde em 2011, contudo, a atuação é mais antiga. Tenho colegas que atuam na obstetrícia há mais de 30 anos, porém eu vejo que seu crescimento é algo mais atual, há pelo menos dez anos que eu noto esse aumento. Em relação ao pré-natal e ao pós-parto, a fisioterapia tem uma participação muito forte e agora nós acompanhamos esses cuidados no momento do nascer. Nós já trabalhávamos nos setores adjacentes, então era só questão de tempo até a equipe sentir necessidade da nossa inserção.
Ciência e Cultura: Qual o seu papel no momento do parto?
Aline da Silva: Durante o trabalho de parto, trabalhamos com métodos que minimizem a dor. Aplicamos a verticalização e outros exercícios. Incentivamos, como sugere a boa prática, o livre posicionamento da mãe – seja agachada, de lado, de fácil apoio. Priorizamos a sua experimentação de uma forma segura e orientada, afinal, é um momento delicado e a paciente está vulnerável. Oferecemos esse suporte antes, durante e depois do parto de maneira que seu poder de escolha seja valorizado. Além disso, os fisioterapeutas oferecem apoio a toda a equipe multidisciplinar.
Ciência e Cultura: A atuação de qualquer profissional, sobretudo o de saúde, depende também da estrutura do local de trabalho, sendo assim, a Climério está preparada e bem equipada para atender as grávidas – desde o pré-natal até o momento do parto?
Aline da Silva: Infelizmente, o sistema de saúde hoje tem uma deficiência de leito para obstetrícia, o que sobrecarrega demais as unidades das maternidades de porta aberta, como a Climério de Oliveira. Porém, ainda temos um percurso intenso em responder a essa demanda e não deixar a mulher peregrinar, além de oferecer o melhor suporte possível. O ideal seria uma estrutura muito melhor, mas isso não é uma questão exclusiva da Climério, presente pelo sistema de saúde como um todo. Existe uma gama de deficiências no SUS: desde leitos para parto, atendimento obstétrico e nas emergências. Na rede particular também há problemas: não há fácil disponibilidade para partos normais, a sua emergência deixa a desejar. O nosso sistema inteiro precisa ser revisto.
Ciência e Cultura: Como foi o seu processo de instrução para atuar na realização do parto humanizado?
Aline da Silva: Eu fiz a minha especialização na área da saúde da mulher, isso levando em conta a minha graduação em fisioterapia e minha pós-graduação em uroginecologia. Hoje em dia há uma grande seleção de cursos e aperfeiçoamentos dentro da fisioterapia, voltada especificamente da obstetrícia, e dentro desses encontramos a atuação no pré-natal, no parto, e no puerpério – incluindo assim as três fases da gestação.
Ciência e Cultura: Qual a capacidade da Climério?
Aline da Silva: Lá são seis leitos de pré-parto e todos com uma rotatividade muito alta. Ainda assim, a demanda pela supera a capacidade. A nossa estrutura é de um hospital-escola e supostamente essa quantidade bastaria para essas dimensões, mas a procura nos lota bastante.
Ciência e Cultura: Acredita que estamos caminhando para mais esclarecimento sobre o benefício do parto humanizado?
Aline da Silva: Com certeza. Eu acho que toda mudança gera polêmica, algo que o parto humanizado passou. Essa substituição dos valores de natural e biológico pela institucionalização, que aconteceu tantas décadas atrás, foi invertida pelo retorno ao original fisiológico. Isso causou muita comoção, porém, trazemos evidências, estudos para demonstrar como a maneira natural e focada em intervenção mínima é superior. E todas essas pistas científicas corroboram para essa futura realidade, sem excessos de interferências no parto.
Ciência e Cultura: Na sua opinião, o que é preciso para tornar o parto humanizado mais acessível às baianas, sobretudo as com baixo poder aquisitivo?
Aline da Silva: Por incrível que pareça, há uma cultura de estímulo ao parto natural mais forte no serviço público que no privado. O acesso das baianas de baixo poder aquisitivo é melhor, tanto que os indicadores de parto cesáreo nas redes particulares são muito mais altos, até mais que o dobro.
Ciência e Cultura: Se o parto humanizado é considerado a melhor escolha para a saúde das novas mães e para seu recém-nascidos, a que podemos atribuir o grande número de partos cesáreos?
Aline da Silva: Acredito que aqui é bastante cultural: quando a parturiente decide no parto cesáreo, na verdade o que falta é informação sobre o procedimento natural. Elas não teriam medo do parto normal em si, porém da sua dor. Há um enfoque muito forte nesse sofrimento, o que assusta a maioria das mulheres. Contudo, com tanta divulgação de dados do natural, a tendência é diminuir os índices do método cirúrgico.
Ciência e Cultura: Qual a vantagem para as pacientes que decidem por este procedimento e não outro como o cesáreo, por exemplo? Como vem sendo a resposta das pacientes?
Aline da Silva: Muitas das pacientes contempladas pelo procedimento humanizado já tiveram o seu primeiro filho de outra maneira e relatam uma sensação de conforto maior, uma experiência de parto melhor. Elas se sentem acolhidas e falam dessa atenção, são gratas até.
Ciência e Cultura: A Climério é referência no cuidado à mulheres que têm filho no nosso estado. Pode contar como se dá o processo aceitação e de acolhimento dessas mães?
Aline da Silva: Na rede pública, a estrutura de maternidades prioriza proximidade na hora do parto, então, uma mulher é preferencialmente vinculada a uma unidade perto de sua moradia. Mesmo a Climério de Oliveira sendo uma maternidade de porta aberta, isto é sem pacientes reguladas, as pacientes são indicadas para outro lugar mais próximo. Entretanto, independentemente disso, acaso apareça uma transeunte buscando auxílio, ela será acolhida, avaliada pela equipe e então encaminhada para seu setor, acaso seja necessário. Todas que chegam serão recebidas.
*Estudante do Curso de Jornalismo da Faculdade de Comunicação da UFBA e repórter da Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura