O desafio de ensinar ciências para crianças nos anos iniciais do ensino fundamental é uma tarefa de professores e pesquisadores
Nelson Rui Ribas Bejarano*
nelsonbejarano@gmail.com
O 18º volume da coleção “Explorando o Ensino”, que recebeu o nome Ciências, nasceu no âmbito da avaliação dos livros didáticos de ciências para os anos iniciais – PNLD-2010 (Programa Nacional do Livro Didático) e foi publicado pelo MEC. Vários avaliadores consideraram importante que fosse feito um livro endereçado ao professor dos anos iniciais que trabalha na disciplina de ciências com alunos do 1º ao 5º anos (6-10 anos, aproximadamente). O livro, na forma eletrônica, está no portal do MEC, que em breve deve ser publicado em papel em uma tiragem de mais de 150.000 (cento e cinqüenta mil exemplares).
No livro tem artigos de astronomia, biologia, microbiologia, saúde, física e química, num total de 13 textos, todos buscando aliar o rigor do conhecimento científico considerando, no entanto, que se trata do primeiro contato formal do aluno com a disciplina.
A história do ensino de ciências para crianças no Brasil tem dois momentos importantes: um com a LDB/1961 que tornava obrigatório o ensino de ‘ciências naturais’ nos dois últimos anos do antigo ginásio (o equivalente hoje à 7ª e 8ª série). Um segundo momento ocorre dez anos depois com uma lei federal (1971) que ampliava a obrigatoriedade do ensino de ciências para todo o que hoje denominamos de ensino fundamental.
Não é foco do presente artigo falar da história do ensino de ciências, embora uma pequena avaliação seja necessária. Uma coisa é uma lei educacional tornar obrigatório o ensino de uma disciplina, outra é a realização, com qualidade, do cumprimento do aspecto legal. O problema esbarra em aspectos como infra-estrutura (laboratórios equipados de ciências, por exemplo) e especialmente professores que estejam capacitados para ensinar ciências.
Na década de 60 o sistema de ensino era menor, por isso dizem que o ensino era melhor. Na realidade o custo da educação era menor, os professores tinham mais tempo para estudar, enfim. Já na década posterior não podemos esquecer o contexto da ditadura militar, o sistema escolar começava a ficar maior e se iniciava o declínio da qualidade do ensino básico que vemos até hoje.
O livro Ciências então visa colaborar com esse professor que muitas vezes teve uma formação precária em ciências, quando teve, e se vê diante do desafio de ensinar ciências para crianças que estão em seus anos escolares iniciais.
Vamos comentar brevemente os dois textos/artigos que compõe o livro e se endereçam ao ensino de química. Nosso desafio inicial foi tentar responder às seguintes questões: O que é adequado ensinar de química para crianças? Vamos falar da linguagem química que envolve signos como fórmulas químicas, equações químicas? Enfim nossos problemas estavam ligados à adequação do que trata a ciência química e seus formalismos, com a idade das crianças e sua capacidade cognitiva de entender especialmente essa nova linguagem, a linguagem química.
Por exemplo, argumentava um dos autores, já existe na praça um refrigerante com o nome H2O, os jornais falam todo tempo de gases do efeito estufa, que existe um tipo de chuva que é ácida, enfim, a Química tem uma posição de negligência em relação à cultura e a história, embora haja um sentimento da força dessa ciência em relação aos seus produtos. Por outro lado, há um sentimento de que a Química pudesse ser prejudicial à sociedade.
Nesse quadro de dificuldades que nos propomos a escrever para os professores que são desafiados a ensinar química para crianças.
No capítulo 3 do livro, os professores Roque Moraes e Maurivan Ramos pesquisadores na área de educação química escreveram “O ensino de química nos anos iniciais. Ampliando e diversificando o conhecimento de mundo”. Na visão desses pesquisadores, no ensino de química para crianças o aspecto importante é o cotidiano dos alunos. Inicia-se o ensino com questões que estão postas nesse cotidiano, para que paulatinamente vá se introduzindo o ensino de química de maneira um pouco mais formal.
Em seguida quando os alunos estiverem mais maduros (3º ao 5º ano) seria possível uma aproximação mais formal onde apareceria o conceito central da química: A reação química, mesmo que ainda partindo do cotidiano, ao propor investigar, por exemplo, o estudo da queima de um gás para o cozimento dos alimentos. Os autores acreditam que nesse movimento, que parte do cotidiano, é possível que aos poucos possa ser apresentada a linguagem química propriamente dita.
No artigo que colaboramos “Química nos anos iniciais para integração do conhecimento”, juntamente com a professora Maria Inês Rosa (Professora da Faculdade de Educação da Unicamp), a idéia foi um pouco diferente. Partimos da constatação de que os professores que irão ensinar química nos anos iniciais poderiam ser pedagogos, ou ainda professores do chamado magistério, embora possa ter em proporções minoritárias professores licenciados nas áreas de ciências.
O texto argumenta também no sentido de que o ensino de ciências teria uma característica diferente da ciência. De fato estaríamos fazendo uma transposição desse conhecimento do âmbito científico para o de uma disciplina escolar. Nós apresentamos uma argumentação, apontando uma preocupação de que nessa faixa de idade a disciplinarização excessiva seria prejudicial.
De maneira que o ideal seria pensar o ensino de química de maneira interdisciplinar, ou seja, inicialmente de forma articulada com outras áreas do conhecimento. A partir dessa constatação o texto indica o tema ‘Água’ como algo que tivesse a capacidade de iniciar a discussão sobre conhecimentos químicos, sem perder a articulação com outras áreas que para as crianças são indistinguíveis.
O ensino de química sempre foi considerado “difícil” pelos alunos. O problema está em vários níveis. Um deles é a própria formação dos professores, ou melhor seria dizer “dos programas de formação inicial e continuada de professores”? Outro aspecto estaria ligado à própria linguagem química, que assim como a Física, tem signos próprios, apoiados fortemente na Matemática e que podem se tornar incompreensíveis para os alunos, quando não ensinados adequadamente.
Estamos certos que ensinar ciências para crianças seja uma decisão correta (como vimos uma decisão de 1971, ou seja, algo que nos desafia há pelo menos 40 anos). A despeito disso não estamos certos que os grandes sistemas de ensino estejam conseguindo vencer completamente esse desafio.
Nosso texto então é uma pequena reflexão para que o professor possa se apoiar quando for ensinar química para seus alunos.
Sugerimos que, para maiores detalhes, observem o livro no site do MEC.
*Professor do Instituto de Química da Universidade Federal da Bahia – Ufba
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Sou professora de psicologia da educação no curso de licenciatura em química, estamos querendo desenvolver um projeto de extensão dentro de ensino de química na ensino fundamental. Como poderia ter acesso a esta coleção? Obrigada
tatiana
Ola Tatiana,
Só agora estou vendo sua mensagem.
Tenho uma copia em papel do livro, embora haja uma versão eletrônica disponível na rede.
Me envie uma mensagem para conversarmos.
abraços
Nelson Bejarano