Na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, pesquisa da Ufba revela que 72,8% dos jovens baianos de quatro escolas públicas não conhecem nenhuma instituição de pesquisa e 87,7% desconhecem nomes de pesquisadores do estado
Simone Bortoliero*
bortolie@gmail.com
Está completando vinte e quatro anos da publicação pelo CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – da pesquisa encomendada ao Instituto Gallup intitulada “O que o brasileiro pensa da ciência e da tecnologia, realizada em 1987. Em 2003, outra pesquisa sobre o tema da ciência foi elaborada pelo Labjor -Laboratório de Jornalismo Avançado da Unicamp e apoiada pela Fapesp – Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo, intitulada “Percepção pública da ciência e tecnologia”.
A pesquisa foi também aplicada em vários países da América Latina e países ibéricos. Em 2006 o Ministério da C&TI através do setor de Popularização aplicou um questionário em diferentes regiões do país para também conhecer o que o brasileiro do século XXI pensa a respeito de ciência e tecnologia. Em todas essas pesquisas há dados sobre a utilização dos meios de comunicação como fonte de informação de temas científicos pela população brasileira.
Na Bahia, em 2004, também foi realizado uma pesquisa de percepção de C&T junto aos professores da rede municipal, no ano seguinte e em 2006 houve aplicação de um questionário com jovens do ensino médio de duas escolas da capital soteropolitana Evaristo da Veiga e Colégio Militar. Os resultados nessas escolas apontaram que 63% dos entrevistados se consideravam pessoas pouco informadas sobre ciência e tecnologia. Os dados daquele período mostram que os temas de maior interesse dos jovens eram a medicina/ biologia/genética (40%), a informática (24%), a mecatrônica (17.5%) e o meio ambiente (9%), sendo que deste, o assunto mais citado foi o aquecimento global. No ano de 2005, um total de 33% dos jovens entrevistados em Salvador, afirmaram que gostariam de se manter informados em C&T, pois eram temas importantes e quando buscavam informações o faziam usando a internet (30%), a TV (24%), o rádio (18%) e 28% somaram os que utilizam os jornais, as revistas, a TV a cabo, entre outros.
Em 2010 e 2011 foram aplicados 1.236 questionários em 03 escolas da capital baiana e 01 no interior do estado. Os resultados desse ano reafirmam os dados anteriores e nos colocam alguns desafios. A pesquisa PERCEPÇÃO PÚBLICA DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA ATRAVÉS DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO: O USO DE TECNOLOGIAS EMERGENTES (CELULARES) NA PRODUÇÃO DE VÍDEOS CIENTÍFICOS PARA PÚBLICO JOVEM EM SALVADOR/BAHIA[i] (2010-2011) alcançou todos os estudantes dos 3° anos do Colégio da Polícia Militar de Dendezeiros, (359 alunos matriculados), Colégio Estadual Evaristo da Veiga (300 alunos) Colégio Estadual Odorico Tavares (121 alunos) e do Centro Educacional de Seabra (456 alunos de área rural e urbana) na Chapada Diamantina.
Perguntamos aos jovens da Bahia qual a idéia que fazem dos cientistas/pesquisadores que trabalham nas instituições de pesquisa do nosso estado. Para 52,4% dos jovens, os pesquisadores são pessoas cultas que produzem coisas úteis para a humanidade, sendo que para 16,8% são pessoas inteligentes que trabalham muito sem almejar ser rico. Reside nestas respostas uma imagem positiva e inocente sobre o papel dos pesquisadores na vida social, cultural e econômica, ou seja, os jovens acreditam que os pesquisadores estão na maioria das vezes trabalhando para descobrir coisas boas.
Gráfico demonstrativo sobre a imagem que os entrevistados têm dos cientistas que trabalham nas instituições de pesquisa da Bahia
Um dos dados mais preocupantes é que 72,8% dos jovens baianos entrevistados não conhecem nenhuma instituição de pesquisa na Bahia. E quando aparece uma instituição citada pelos estudantes, temos a Ufba e o IBGE, em primeiro e segundo lugares. Interessante porque são alunos em fase de vestibular e é no mínimo estranho o desconhecimento de instituições que fazem pesquisa como Uneb, Uesc, Fiocruz, entre outras do estado. Um dado comum em outras pesquisas desta natureza também aparece nos dados da Bahia. Trata-se de um número muito alto de jovens que afirmam não conhecer nenhum nome de pesquisadores da estado, são quase 87,7 % de respostas. De imediato, o que se percebe é que, de maneira geral, os estudantes conhecem as instituições porque irão prestar vestibular, mas não sabem que nestas mesmas instituições se produz conhecimento e tecnologia.
O único pesquisador citado na Bahia foi Elsimar Coutinho e mesmo assim, foi descrito com diversos nomes incorretos, como Alcimar Coutinho ou Neimar Coutinho. Sobre cientistas/pesquisadores famosos em outras partes do mundo, 63,1% dos estudantes afirmaram não conhecê-los. Apenas 25,7% deram resposta positiva à pergunta, e os mais citados, em ordem, foram Albert Einstein, Isaac Newton, Charles Darwin, repetindo dados de pesquisas nacionais.
Na semana que se pretende popularizar o conhecimento cientifico vejo como nosso grande desafio aproximar o conhecimento científico produzido nas universidades públicas dos jovens baianos. Esta tarefa é árdua, demorada, instigante, desafiadora e depende de parcerias que buscam o compromisso com uma ciência cidadã. Podemos também contribuir através dos veículos de comunicação de massa, derrubando o mito da ciência na torre de marfim, divulgando os processos científicos em detrimento dos produtos, compreendendo as imagens de ciência e de tecnologia que permeiam a sociedade brasileira. O combate ao analfabetismo científico no Nordeste passa por ações integradas de comunicação científica e educação para as ciências. Nesse sentido nada mais justo do que contribuir com a juventude na consolidação de espaços de comunicação, onde a democratização do conhecimento cientifico seja de fato realizada com criatividade, com alegria, com curiosidade e com respeito aos interesses desse público.
O questionário pede que os estudantes citem três descobertas científicas ou tecnológicas que consideram mais importantes para a humanidade. Um total de 62,2% respondeu à questão, e as três mais citadas, em ordem, foram as células-tronco, seguidas da internet, e ainda do computador e da aviação, estes dois últimos com o mesmo número de citações.
Além disso, foi perguntado aos estudantes se existe alguma descoberta científica ou tecnológica que eles consideram nociva ou prejudicial à humanidade, e 30,6% deles afirmaram existir. Dentro deste percentual, a bomba atômica teve a maior parte das citações. Isso se repete na maioria das pesquisas sobre percepção no Brasil com relação aos aspectos negativos da tecnologia, ou seja, o poder bélico da bomba atômica e sua capacidade de destruir vidas humanas ainda continua presente na mente dos jovens, mesmo que eles pertençam a uma geração distante das vítimas da 2ª. GM.
Entretanto uma das questões chama nossa atenção para o fato de que 50,1% de jovens responderam “não existir nenhuma descoberta científica ou tecnológica que possa ser prejudicial à humanidade”. No mínimo nos leva a outra reflexão: as imagens da ciência estão sendo representadas pelas diferentes mídias no país ou no exterior, em seus aspectos positivos e sem uma visão crítica por parte daqueles que as veiculam. Significativa porção dos entrevistados (mais de 19%) não respondeu a essa pergunta. O celular, o computador e a televisão, em ordem, foram os três mais citados pelos 50,7% dos entrevistados que afirmaram existir descobertas científicas e tecnológicas que os ajudam a viver melhor em sua vida cotidiana, pessoal e no seu trabalho diário.
Repetindo praticamente os mesmos dados apontados na pesquisa de 2006, na Bahia em 2011 um total de 55,2% dos jovens afirma ser a medicina e o aquecimento global os temas de maior interesse em Ciência e Tecnologia. Mas desta vez, 49,9% dos entrevistados afirmaram que aprendem conteúdos científicos nos sites da internet. Na internet, o assunto mais procurado continua a ser aquecimento global. Entretanto, quando o questionário pergunta se esses jovens acham suficiente a quantidade de assuntos científicos na internet, 30,3% afirmam que não, 24,7% dizem que sim, e 29,6% não sabem responder. Um total de 15,4% não respondeu à questão.
Gráfico demonstrativo do percentual de respostas da pergunta “Você se considera uma pessoa informada no que se refere à Ciência & Tecnologia?”
Pelos dados da pesquisa, e aqui não discutimos todos as respostas que ainda estão sendo tabuladas de um questionário com 36 questões, percebe-se que a divulgação científica não pode apenas ser uma atividade esporádica de uma semana nacional numa cidade de quase três milhões de habitantes. Para resolvermos o problema de acesso ao conhecimento cientifico produzido nas universidades, há necessidade de investimentos na educação científica dos jovens baianos. Apesar da iniciativa da Fapesb com editais de Popularização da Ciência e da Tecnologia, inclusive considerando desde 2009, o universo da pesquisa acadêmica, ainda é insuficiente as verbas disponíveis para esse campo do conhecimento.
Trata-se de pensar que a divulgação científica não tem a função de resolver os problemas da educação científica do ensino médio. As políticas públicas devem contemplar maior investimento na formação dos professores de ciências em nosso estado, pois sem professores bem formados e bem pagos não haverá ensino de qualidade.
Portanto o objetivo de motivar os jovens baianos para vocações cientificas deve ser assumido nas políticas públicas estaduais e como compromisso de nossos governantes se quisermos tirar nossos jovens do analfabetismo científico em que se encontram na Bahia.
[i] Pesquisa patrocinada pela Fapesb dentro do edital PopCiências/2009 sob coordenação da Prof.Dra. Simone Bortoliero (Facom-Ufba), em colaboração com a estatística Rita Duyprat e dos bolsistas: Mariana Sebastião, Luana Santana, Ledson de Oliveira Chagas, Rogério Menezes, Deivson Nacim Souza Projeto que teve como parceiros a Fiocruz-Bahia, ABJC- Associação Brasileira de Jornalismo Científico, a Pós Graduação em Cultura e Sociedade/Ufba, os Colégios: Odorico Tavares, Evaristo da Veiga, Polícia Militar – Dendezeiros, além dos alunos do Projeto Ciência&Arte e Magia, coordenado pela Prof.Dra. Rejane Lira do Instituto de Biologia da Ufba.
*Coordenadora do Curso de Especialização em Jornalismo Cientifico e Tecnológico, professora da Facom-Ufba e Vice-Presidente da ABJC (2009-2011)
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A urgência de políticas de incentivo à divulgação de ciência no Brasil
Ensinando Ciências para Crianças: Coleção Explorando o Ensino
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