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Atualizado em 12 DE setembro DE 2011 ás 13:38

Fernando Conceição

Professor comenta sobre o projeto Faces do Brasil que anunciou renovação de contrato com a Ford Foundation para mais 18 meses de pesquisa

Por Ítalo Cerqueira*
italo.lirio@gmail.com

Coordenador do projeto Faces do Brasil, o professor PhD Fernando Conceição participa do grupo de pesquisa Etnomídia da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Facom/Ufba). O projeto monitora 23 veículos impressos (17 jornais e 6 revistas semanais/mensais) observando como focam em suas páginas temas relacionados a três grupos sociais historicamente marginalizados do país: negros, índios e ciganos. Recentemente, foi anunciada a renovação do contrato de doação de US$ 150.000,00 por parte da Ford Foundation para a segunda fase do projeto de pesquisa Faces do Brasil que durará mais 18 meses.

Professor PhD Fernando Conceição durante entrevista

O professor concedeu entrevista exclusiva, sobre os detalhes do projeto e a repercussão da primeira fase. Comenta também sobre o que está sendo programado para a segunda etapa.

Ciência e Cultura - O projeto Faces do Brasil foi criado com o intuito de monitorar a mídia impressa do país com relação a questão étnico-racial, mais precisamente observar e analisar o olhar destes para com os negros, índios e ciganos. Qual foi o ímpeto que lhe ocorreu para estruturar um projeto baseado nesta premissa?

Professor Fernando Conceição – Existe um grupo de pesquisa chamado Etnomídia criado na Facom, em 1998, quando eu ainda era professor substituto. Este grupo de pesquisa, Etnomídia, realizou desde então uma série de projetos de pesquisa, alguns apoiados pelo CNPq, PIBIC, como por exemplo, uma pesquisa que fizemos em 1999 para verificar como a imagem dos afro-descendentes era mostrada nas páginas policiais do jornal A Tarde e do Correio da Bahia.

Outra pesquisa que fizemos também foi uma pesquisa chamada “Mapeamento dos guetos musicais de Salvador e região metropolitana” em 2001, 2002 e 2003, a gente queria ver o que ocorria nos guetos musicais e como esta musicalidade dos guetos de Salvador e região metropolitana era apreendida pela indústria cultural. Então fomos em vários locais onde tocava Arrocha, ainda nos primórdios, em Candeias, Madre de Deus, região metropolitana de Salvador, esta foi outra pesquisa apoiada pelo PIBIC. E, em 2008, a Fundação Ford me procurou, perguntando se eu como professor, pesquisador da área de mídia e etnicidade, não gostaria de apresentar um projeto para eles, da Fundação Ford, um projeto ligado a monitoramento de jornais e revistas impressos. Então, o projeto Faces do Brasil nasceu como uma provocação feita a mim pela diretora-geral da Fundação Ford no Brasil, chamada Ana Toni. Ela me convidou a apresentar um projeto de pesquisa, coisa que o CNPq jamais faria. Eu apresentei e ela disse: “Eu posso dar tantos mil dólares” e repare que quando a Fundação Ford me procurou, eu disse: “Eu não vou ter tempo para escrever” e ela me disse: “Mas eu vou te dar um dinheiro só para você escrever”. Na época, eles me deram US$ 5.000,00 só para escrever o projeto. Eu escrevi e submeti e aí eles deram, ano passado, 2010, mais ou menos US$ 120.000,00. Nós estamos concluindo esta primeira fase agora, estamos em fase de conclusão e análise dos dados, portanto, até março nós vamos publicar um relatório com os resultados da primeira fase e, enquanto isso, a Ford já aprovou o apoio a uma segunda fase que começa agora em setembro de 2011 e vai até fevereiro de 2013, são 18 meses.

O professor comenta os avanços do projeto

Ciência e Cultura – Um dos pilares do projeto é a tentativa de democratização dos meios de comunicação no âmbito da questão étnico-racial. O senhor acredita que os meios de comunicação estão dispostos a discutir uma abertura de espaço e uma mudança de comportamento frente a questões que envolvem as minorias do país?

Professor Fernando Conceição – Os donos dos meios de comunicação, não sei se eles estão. Esta pergunta deveria ser feita diretamente a eles. O que nos compete, pesquisadores e ativistas do movimento social, é tentar promover um debate, coisa que, nesta primeira fase da pesquisa ocorreu de forma positiva. Nós tivemos o seminário no dia 13 de maio, convidamos os principais redatores dos principais jornais, diretores, eles compareceram, ouviram críticas. Então, mostra que, eu não sei se eles estão dispostos a abrir, mas nós podemos provocá-los, estabelecer um diálogo.

Ciência e Cultura – No dia 13 de maio, foi promovido o primeiro seminário de prestação de contas do Faces do Brasil. Comente sobre a repercussão.

Professor Fernando Conceição – Foi bastante positiva. Acho até que a repercussão foi tão positiva que a fonte financiadora ficou impressionada, a direção da Ford ficou realmente bem impressionada, a ponto de, também desta vez nos chamar: “Olha, a gente quer continuar, queremos que vocês continuem se fortalecendo”.

Ciência e Cultura – A partir deste seminário, que contou com a presença Ranulfo Bocayuva, de A Tarde, e Sérgio Costa, de O Correio, como a imprensa baiana tem visto o trabalho de monitoramento do Faces? A recepção tem sido positiva?

Professor Fernando Conceição – Foi. O seminário foi pensado como nacional, primeiramente, mas implicou em recursos. Quer dizer, primeiramente, nós pensamos em fazer aquele seminário no Rio de Janeiro, na sede da Fundação Ford, chamando diretores de jornais de todo Brasil. Então, escrevemos o projeto, apresentamos a Fundação Ford, só que a Fundação Ford estava em uma época que não tinha recursos para financiar um seminário daquele. Mas haverá um seminário final, com este resultado final que nós temos que organizar para publicar o relatório da primeira fase e aí nós vamos escrever um projeto para este seminário acontecer no centro de discussão, que é no Rio de Janeiro, e este seminário será nacional. Vamos ter que escrever um projetinho, captar recurso e fazer este seminário, convidando os diretores de jornais, convidando as autoridades do Congresso Nacional que lidam com o debate de democratização dos meios de comunicação, convidando instituições como a Ordem de Advogados do Brasil (OAB), Associação Brasileira de Imprensa (ABI), vamos convidar todo mundo, para refletir este assunto.

Ciência e Cultura – O projeto Faces do Brasil fechou o seu primeiro ciclo agora em julho, com 1 ano de monitoramento dos principais jornais e revistas do país. De modo preliminar, qual foi o saldo desta primeira etapa?

Professor Fernando Conceição – O primeiro saldo foi positivo. Nós nesse período formamos um grupo de estudantes que se envolveu com a pesquisa do grupo, então eu, como professor, estou cumprindo uma das minhas atribuições de docente que é formação de pessoas, de estudantes que se interessam por pesquisa. Isso sem contar com o apoio institucional, no sentido que não é a Universidade Federal da Bahia, não é CNPq, nem CAPES, eu busquei recursos fora. Então a primeira coisa positiva é esta, os estudantes se envolveram, pesquisaram, e isto também impressionou muito a Fundação Ford, que isto não é comum para os projetos apoiados pela Ford, formar massa crítica e etc.

Agora, quanto ao resultado do monitoramento, posso falar nos dados preliminares apresentados no seminário e que foram publicados. Variou muito a forma como os jornais tratam a imagem de negros, índio e ciganos, a depender da região. Uma coisa é certa: ciganos praticamente não aparecem, os indígenas aparecem como um problema econômico, estão no meio do caminho, como em projetos de hidrelétricas. Os índios, principalmente em regiões de fronteira, são apresentados como um problema para o desenvolvimento econômico. E parece que em regiões como Salvador e Rio de Janeiro há uma melhoria na imagem dos afrodescendentes. Isso eu acho que é fruto, agora falo como ativista, de uma luta do movimento negro, que a gente tem há mais de trinta anos. Isso o que os movimentos gays estão fazendo agora, eles estão, inclusive, se inspirando no nosso ativismo que começou lá atrás. Então, hoje podemos até colher bons frutos disso, ainda poucos, mas há uma melhoria na cobertura.

Ciência e Cultura – Recentemente, a Ford Foundation, financiadora do grupo, renovou o contrato de doação e destinou US$ 150.000,00 para uma segunda etapa do projeto, como ela será?

Professor Fernando Conceição – É uma continuidade do monitoramento de mídia, além daquela coisa do mercado, quer dizer, eu tinha proposto a Fundação Ford, em vez de a gente monitorar mídia impressa, nesta segunda fase, a gente monitorar TV, mas a Fundação Ford apelou para que a gente continuasse: “Se vocês quiserem monitorar TV, tudo bem! Mas a gente gostaria que continuasse para poder ver se há uma alteração na cobertura por conta da pesquisa”, ou seja, se a pesquisa e a divulgação dos dados parciais têm influenciado na mudança da postura de Jornal A Tarde, por exemplo, que passou a pautar de forma diferenciada os ciganos depois do seminário.

Ciência e Cultura – O Faces do Brasil é um primeiro passo para se concretizar um antigo sonho seu, que é o observatório de imprensa aqui na Bahia referente à questão étnico-racial, este sonho ainda permanece? Conte mais sobre ele.

Professor Fernando Conceição – Na verdade é um projeto de ter um observatório, porque tem um observatório de criança e adolescente, tem observatório da mulher, tem observatório de imprensa de um modo geral, tem vários observatórios pela democracia da comunicação, etc. Então, nós achamos que há um lugar para ter um observatório sobre o olhar étnico-racial, porque o racismo permanece em nosso país. As discriminações, a violência que vitima estes grupos eleitos por nós continua, a violência contra estes grupos continua. Então, a gente acha que os meios de comunicação podem contribuir para diminuir este tipo de olhar estereotipado, racista que até hoje permanece. Então, um observatório ou pode ser também uma agência para produção de notícias para debater, ser interlocutora junto com os meios de comunicação, pode melhorar o conteúdo produzido pelos meios de comunicação em relação aos ciganos, em relação aos indígenas, em relação aos negros. Então é um projeto, esta pesquisa Faces do Brasil, ela vai nos dar know-how para criação de uma metodologia, nós estamos criando uma metodologia específica, e com este know-how pretendemos, em médio prazo, propor a criação de um observatório nacional aqui em Salvador. Isto requer recursos, a gente vai ter que ter espaço, equipamentos, equipe trabalhando. Enfim, é um projeto grande que requer recurso, enquanto isto, nós temos que correr em busca de recurso.

*Estudante de Produção Cultural da Faculdade de Comunicação da Ufba – Facom

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