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Atualizado em 2 DE maio DE 2013 ás 18:24

A mulher vencendo barreiras

Após vir se formar na Faculdade de Medicina, Francisca Praguer Fróes torna-se a primeira professora da unidade, em 1898.

POR CLÁUDIO ANTÔNIO DE FREITAS BANDEIRA*

Não apenas nos estudos biomédicos, a Faculdade de Medicina da Bahia fez avançar a ciência biomédica brasileira. Foi também pioneira no quesito da emancipação feminina. É o que revela a história acadêmica de Rita Lobato. Cansada do assédio preconceituoso de que era alvo na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Rita Lobato (1867-1954), transfere-se para Salvador e consegue vencer barreiras, tornando-se a primeira mulher a formar-se em medicina no Brasil.

Logo depois, em 1898, Francisca Praguer Fróes torna-se a primeira professora da Faculdade de Medicina. A instituição passou por alguns anos de estruturação. Os professores, arregimentados do corpo médico, eram em sua maioria formados em Coimbra e que atuavam em Salvador, não recebiam proventos e a pesquisa científica ficava a cargo da iniciativa individual. O sistema de matrícula era precário, bem como o controle de aproveitamento e frequência dos alunos. O curso de medicina durava quatro anos e só passou a ser ministrado em cinco a partir de 1815, com a elaboração do Plano de Estudos. Mas foi em 1832, com a reforma do ensino superior, que passou a ter duração de seis anos, quando se cria também o curso de farmácia e de obstetrícia. “Em seu início, a ênfase do curso era na anatomia e o domínio clínico era pouco valorizado”, comentou o professor Tavares-Neto, em 2008.

Tese rejeitada – A doutora em filosofia Dinorah d’Araújo Berbert de Castro relata, em artigo de sua autoria, que apenas cinco dias após a criação da pioneira escola de medicina, começa a ser formado o corpo docente. No início, revela, apenas dois eram seus lentes: o brasileiro Manoel José Estrela, para a cadeira de “Cirurgia Especulativa e Prática” e o português José Soares de Castro, para as lições teóricas e prática de “Anatomia e Operações Cirúrgicas”. A apresentação de teses começa em 1836. Dinorah Berbert de Castro relata que a primeira e única tese rejeitada na Faculdade de Medicina foi a do doutorando Domingos Guedes Cabral, em 1874 .

Com o título “Funções do Cérebro”, a tese foi rejeitada pela comissão da faculdade por achar o trabalho “lesivo à religião do Estado”. Com ajuda dos colegas, que levantaram fundos, Guedes Cabral publicou sua tese em 1875. “O acontecimento marcou época… O motivo preponderante para tal rejeição foi a desabrida forma com que o autor, extrapolando o cunho científico, entra nos campos metafísico e religioso para ridicularizá-los”.  No ano seguinte, Guedes é proclamado doutor em medicina com outra tese, desta feita com um tema mais atual do que nunca: “Qual o melhor tratamento para a febre amarela”.

A velha faculdade catalisou o movimento estudantil em vários instantes da vida nacional. Quando Jânio Quadros renunciou à presidência da República, em agosto de 1961, a Faculdade de Medicina viveu o seu último episódio de resistência democrática. Os estudantes ocuparam a escola e fizeram dela uma trincheira para exigir a posse do vice-presidente eleito João Goulart. O Terreiro de Jesus foi cercado pela polícia e os estudantes acabaram se rendendo.

Com a reforma universitária, promovida pela ditadura militar em 1968, a velha faculdade (já integrando da UFBA, criada em 1946) foi transferida, em 1977, para a nova sede de concreto exposto, no Vale do Canela, depois de funcionar por 168 anos no Terreiro de Jesus. Nada que lembrasse o imponente prédio, “com salas com vista para o mar da baia” que passou a sofrer um crescente processo de deterioração.

Confira as primeiras matérias da série Memória da Medicina

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*Cláudio Antônio de Freitas Bandeira é jornalista especializado em Jornalismo Cientifico e Tecnológico

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