Pesquisas explicam excesso de salivação ‘baba’, as limitações da levadopa e propõem tratamento alternativo
Por Raimundo de Santana
raimundodesantana@gmail.com
“Está vendo aqui meu filho? Esta tremedeira não me impede de dirigir o meu táxi. Eu estou assim porque não tomo o remédio há dois dias. Estou indo pra casa almoçar e hoje não vou esquecer do remédio”. Este relato foi feito pelo taxista José Saturnino Moura*, 64 anos, morador da região do Cabula quando dirigia seu táxi pelo Dique do Tororó, em Salvador.
Ele, que roda na praça há quase 35 anos, está entre os 15 e 20 mil portadores baianos de Parkinson e é um dos pacientes atendidos pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Fameb-Ufba).
A Fameb abriga três linhas de pesquisas relacionadas à Doença de Parkinson. São elas: Doenças Neurológicas do Envelhecimento, Doenças Neurológicas Endêmicas do Brasil e Reabilitação Neurológica. Na primeira, especificamente, estudos relacionados à deglutição, à respiração e à infecção respiratória dos portadores da Doença de Parkinson (DP) têm acrescentado contribuições animadoras à investigação científica sobre o assunto e, consequente, incorporado melhorias ao dia a dia do parkinsoniano.
São contribuições baseadas em pesquisas que, embora situadas no âmbito baiano, têm implicações para estudos de aspectos da doença em qualquer parte do mundo. A primeira dessas contribuições tem a participação de professoras e pesquisadoras do Departamento de Neurociências da Faculdade de Medicina.
São estudos que partem da constatação segundo a qual o indivíduo com Parkinson tem o comprometimento da deglutição. E mais do que isso: o problema de engolir está associado também a complicações respiratórias. “Concluímos, então, que indivíduos com esses tinham mais internamentos por conta da pneumonia”, destaca o professor Ailton Melo da Fameb, do Departamento de Neurociências, que investiga a neurologia do envelhecimento com ênfase no estudo das manifestações autonômicas da Doença de Parkinson e reabilitação neurológica relacionada ao envelhecimento.
Deglutinação – De acordo com as pesquisas, as pessoas com problemas de Parkinson e problemas da deglutição têm um risco 10 vezes maior de serem internadas devido à pneumonia do que aqueles que não têm problemas de deglutição, mas o fato concreto é que todos acometidos pela doença terão problemas de deglutição. Já para os pacientes com Parkinson, problemas de respiração e de deglutição aumentam em quatro vezes o risco de morte, em relação aos que não têm problemas desse tipo.
Fruto de uma cooperação entre a Faculdade de Medicina da Ufba e a Pontifícia da Universidade Católica–RS (PUC–RS), que contou com participação de ex-dourando da Ufba, Irênio Gomes (atualmente coordenando o Programa de Pós-graduação em Gerontologia Biomédica), lembra Ailton Melo, estudos mostraram que o mesmo neurotransmissor, a saticolina, responsável pelo comprometimento da deglutição, também estava presente no comprometimento das quedas dos parkinsonianos. Essas quedas dizem respeito ao enrijecimento muscular dos membros inferiores e consequentemente a falta de equilíbrio.
A pesquisadora Carla Menezes (professora da Universidade Estadual de Feira de Santana – Uefs ) mostrou que a melhor droga, “a padrão ouro”, a levadopa, que substitui a dopamina, usada para o tratamento da DP, e de fato melhora a qualidade de vida do paciente, mas não melhora especificamente os problemas relacionados à deglutição. Quanto às quedas, a literatura médica já tem o registro segundo o qual a substância não traz melhoras no padrão da quedas dos pacientes.
Salivação – Outra frente de pesquisa procurou entender o excesso de salivação dos portadores de Parkinson, e posteriormente o seu escorrimento externo, comumente conhecida como ‘baba’. Conforme o professor Ailton Melo, estudos constataram que essa ‘baba’ é em decorrência da dificuldade que os indivíduos têm em engolir.
Ficou constatado que os indivíduos que babavam mais eram internados com mais frequência por conta de infecção respiratória e os que tinham mais infecções desse tipo eram os que morriam. A principal causa de morte dos portadores da doença é a infecção do tipo respiratória.
Dos estudos acerca da ‘baba’, do comprometimento da deglutição e das infecções respiratórias, lembra o professor Melo, concluiu-se que o tratamento atual não é o adequado. A substância presente no medicamento usado em todo o mundo, a levadopa não é a adequada porque não diminuem as infecções tampouco as mortes, embora traga melhorias significativas em outros aspectos da doença.
Diante desse fato, os pesquisadores da Ufba partiram para uma abordagem alternativa de tratamento. Essa via alternativa está ligada ao desenvolvimento de padrões de exercício para melhorar a deglutição dos portadores do Mal de Parkinson. Junto com o professor Irênio Gomes, a professora Ana Caline Nobrega tem incorporando ao tratamento da doença atividades do campo da Fonoaudiologia. “Estamos trabalhando com exercícios orais que diminuem o risco de aspiração de alimentos que, consequentemente, diminuem a perda de saliva (a ‘baba’ em excesso), reduzem as internações hospitalares por infecção respiratória e, finalmente, diminuem as morte desses pacientes”, detalha Gomes.
Tecnologia de ponta no tratamento de Parkinson
Duas inovações tecnológicas voltadas para melhor compreender os efeitos da doença e também auxiliar no tratamento dos parkinsonianos ligadas à linha pesquisa Reabilitação Neurológica, da Faculdade de Medicina da Ufba foram premiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa da Bahia (Fapesb).
Trata-se do “Multideglutógrafo” ou “MDG – Multideglutigrafia” que permite determinar um método eficaz, rápido, portátil e preciso de avaliação dos parâmetros funcionais do processo de deglutição nos pacientes portadores da Doença de Parkinson. Foi premiado com o 1º Lugar Categoria Mestrado no ano de 2009.
Também em 1º Lugar na Categoria Mestrado no ano de 2010, o Projeto “ParkiGlove”, cuja função é possibilitar uma avaliação dos distúrbios motores nos pacientes portadores da doença.
Todos dois são fruto da cooperação entre o Grupo de Engenharia Biomédica Biotrônica, Ufba, a Universidade Salvador (Unifacs), o Grupo de Robótica Aplicada (GRA- BA) e a Fundação para o Desenvolvimento da Ciência (FDC), TKS Software, além do financiamento da Fabesb.
Possível em indivíduos acima do 60 anos, Doença de Parkinson pode atingir a juventude
Embora os casos de Parkinson sejam comuns em indivíduos acima dos 60 anos, estudos já identificaram a doença, como fator hereditário, em pessoas na faixa abaixo os 40 anos. “É o que chamamos de Parkinson juvenil e que atinge de 5 a 10% dos casos da doença”, explica o professor Ailton Melo da Faculdade de Medicina da Ufba, do Departamento de Neurociências.
O tremor involuntário das mãos, a rigidez muscular, a lentidão de locomoção e a tendência à queda são suas características, que ocorrem em consequência da degeneração das células situadas na região do cérebro chamada substância negra. São essas células que produzem a substância dopamina, neurotransmissor responsável pelos, dentre outras funções, pelos movimentos do corpo.
* Bem-humorado, o taxista José Moura, que fez a corrida citada no início do texto e me conduziu no seu táxi, pediu que eu usasse um nome fictício para ele.
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Ufba – Hospital das Clínicas (Canela) e Instituto de Ciência da Saúde – ICS (Vale do Canela).
Atendimento ao Público (consulta) às quartas-feiras à tarde no Setor de Neurologia Hospital Universitário Professor Edgar Santos (Hospital das Clínicas).
Tratamento: deglutição e respiração, Instituto Ciência da Saúde (Vale da Canela), às quintas pela manhã no Setor de Fonoaudiologia
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Doutorando da Famed-Ufba investiga associação entre agrotóxicos e Parkinson
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Mal de Parkinson na internet:
http://maldeparkinson.blogspot.com/
http://www.parkinson.org.br/explorer/index.html
http://parkinsonnabahia.blogspot.com/
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Uso de produtos refinados aumenta risco de doenças, diz especialista
Avanços e retrocessos da Saude no Brasil são discutidos na Ufba durante o The Lancet
Muito bem explicado e muito útil.
Atendo pacientes com Parkinson
Obrigada
boa tarde. Sou portador do Mal de Parkinson, e gostaria de saber como posso ficar atualizado sobre o tratamento e aspectos da doença? grato por qualquer indicação.