“Dá pra você adicionar o material carbonoso para transformar uma terra improdutiva numa terra produtiva?” Esse é um dos questionamentos que o professor Ado Jorio, do Departamento de Física da UFMG, busca responder ao lidar com a nanoestrutura do carbono na terra preta, presente na região amazônica.
POR EDVAN LESSA* - COLABOROU CAROLINA LEMOS**
lessaedvan@gmail.com
Há dois anos e meio Ado Jorio, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), estuda a nanoestrutura do carbono existente na terra preta, localizada ao longo dos principais rios da Bacia Amazônica. O trabalho do pesquisador do departamento de Física consiste em avaliar a viabilidade de utilizar material carbonoso em solo improdutivo, a fim de reverter essa situação que compromete o desenvolvimento produtivo da região.
“É muito difícil de trabalhar com as ferramentas da física em sistemas tão complexos como os solos”, revela Ado Jorio. Mas o professor acredita que, ainda assim, é fundamental observar o problema da improdutividade da terra e tentar contribuir de algum modo. “A gente pôde elucidar a nanoestrutura daquele carvão que está na terra preta, e mostrar, por exemplo, como que ela é diferente e porque ela é diferente do carvão [mineral]”, acrescenta.
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“Dá pra você adicionar o material carbonoso para transformar uma terra improdutiva numa terra produtiva? Dá, só que você tem que saber muito bem o que está colocando lá”, ressalta o professor. Ele avalia que não se pode, apenas, pegar carvão e misturar à terra, principalmente, porque isso está ligado ao processo de liberação do carbono para a atmosfera.
O pesquisador que, no entanto, não é pioneiro nesse tipo de pesquisa, lamenta que produção acadêmica até aqui seja praticamente estrangeira. “Mas isso está mudando”, garante. Segundo ele, tudo começou quando aceitou o convite do Instituto de Pesquisas da Amazônia – INPA. Hoje, conta com o financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Desafios e trabalho interdisciplinar
Para o professor da UFMG, todo o trabalho é absolutamente interdisciplinar. “A gente aprende com os antropólogos, não o que se precisa saber sobre nanoestrutura do material, isso aí está [presente] na física de materiais, mas tudo que eu sei da origem dessa terra”, conta. O grande desafio, com o qual se depara, também perpassa o campo da física, pois, de acordo com Jorio, é preciso ter uma visão tecnológica. E isso envolve a Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), já que trata-se de um estudo no qual a terra é reproduzida de forma sintética.
Foram realizadas pesquisas em materiais sintéticos de laboratório que não tinham correlação nenhuma com a ciência dos solos, segundo o físico. Ele concluiu que, para adicionar algum material com o mesmo efeito do carvão da terra preta é preciso levar em conta a sua nanoestrutura. “Sendo um pouco idealista, esse problema da Amazônia é de toda a região tropical. Então, se você pode melhorar as condições para agricultura, isso seria um feito impressionante”, finaliza.
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Ado Jorio palestrou na 4ª mesa do EFNNE, realizado de 05 a 09 de novembro, em Salvador. Durante o evento, o pesquisador tratou da “beleza do carbono sp²”. O pesquisador que atua, principalmente, com as propriedades de nanomateriais à base de carbono, enfatizou a necessidade de associar esse tipo de estudo ao desenvolvimento econômico no Brasil. Ele detalhou a possibilidade de gerar novos materiais com potencial de reforço mecânico, ao modular a sua propriedade eletrônica.
Materiais como o grafite, grafeno, nanotubos, fullerenos e nanocones são estruturas de carbonos com hibridização majoritariamente sp² e de transporte únicos na natureza. Os 4 elétrons que compõem a camada mais externa do carbono, nesses materiais, formam estruturas robustas, conferindo leveza e resistência às peças produzidas, por exemplo, pela indústria automobilística. Além disso, atribui-se ao material a capacidade de ser condutor ou semi-condutor, o que é bastante positivo, segundo o pesquisador. “É um material muito pouco conhecido e pouco explorado se a gente comparar com outros materiais. Possuem muitas propriedades que são distintas das que existem e do que é utilizado no nosso dia a dia”, lembra Jorio.
*Edvan Lessa é estudante de jornalismo da UFBA e bolsista da Agência Ciência e Cultura.
**Carolina Lemos é estudante de jornalismo da UFBA e bolsista da Agência Ciência e Cultura.