No Brasil, os programas de habitação de interesse social nunca atenderam aos grupos sociais com menor renda. A situação contribuiu para o surgimento das grandes favelas e habitações desordenadas, interferindo diretamente no crescimento dos grandes centros urbanos.
POR MARILÚCIA LEAL*
lealmarilucia@gmail.com
O termo habitação de interesse social designa ações públicas de habitação destinadas às camadas socialmente populares, com renda de no máximo três salários mínimos, que não podem arcar com o financiamento da moradia. O governo subsidia a construção e a compra dos imóveis, facilitando a aquisição por parte desses grupos sociais. Esse tipo de atividade é capaz de intervir no crescimento desordenado de grandes centros urbanos, bem como desacelerar a proliferação e o surgimentos de favelas.
Angela Gordilho, professora da UFBA, doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP), coordenadora do grupo de pesquisa Habitação e Cidade (LabHabita/FAUFBA), alerta , no entanto, para o fato de, historicamente, as ações governamentais com intuito de dinamizar a construção de habitações de interesse social nem sempre atingir o público alvo. “Pouco se atingiu as camadas de rendimento mínimos e informais. Como resultado, as cidades contam hoje com quase metade da sua população morando em favelas, invasões e outras habitações informais”, diz Angela.
As primeiras habitações desse porte foram erguidas após a 2° Guerra Mundial, quando através do chamado Estado de Bem Social foram construídos conjuntos habitacionais nas periferias das cidades devastadas. No Brasil, em 2008, o governo federal lançou mão do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). Além de ajudar o país economicamente, já que o mundo atravessava uma grande crise financeira, a qual reflete até hoje nas relações econômicas dos países, o programa tinha como objetivo dinamizar a construção de unidades de interesse social. Mas este não é primeiro programa federal de habitação social. Entre 1940 e 1960, o programa Casa Popular, por meio dos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs), construiu os primeiros conjuntos residenciais, porém estes eram direcionados apenas a trabalhadores filiados.
Depois, de 1964 a 1968, foi criado o Banco Nacional de Habitação (BNH-SFH), que ergueu 25% do parque imobiliários brasileiro no período, o que corresponde a mais de 4,5 milhões de habitações. Entretanto, este o BNH atendeu apenas às classe media por meio de financiamento direto no mercado imobiliário nas áreas centrais já urbanizadas ou através da construção de grandes conjuntos nas periferias urbanas, voltados para os trabalhadores de carteira assinada, com salário acima de dois salários mínimos. “A rigor, no Brasil, os programas nunca conseguiram alcançar a camada com renda de até dois salários mínimos e, por isso, os que vieram da zona rural durante o processo de industrialização do país acabaram ocupando os cortiços e grandes áreas urbanas, à revelia das legislações vigentes”, completa a pesquisadora.
Os estudos da professora Angela Gordilho se desdobram em três vertentes de investigação. Primeiro, o estudo da produção e das políticas de habitação implementadas recentemente no Brasil, associada à atualização da configuração urbana metropolitana. Iniciado em 2011, com duração de quatro anos, o projeto intitulado “Área central na metrópole: vacância, reabilitação e intervenção habitacional” já teve alguns dados preliminares divulgados em artigos e seminários.
O segundo eixo de pesquisa, também no âmbito da produção do espaço metropolitano, investiga os impactos urbanos em Salvador e na RMS dos grandes projetos e empreendimentos implantados nesse território na última década, com ênfase naqueles vinculados à Copa Mundial de Futebol/2014, no Brasil. Essa investigação, iniciada em 2011, é desenvolvida em parceria com redes locais e nacionais de pesquisas, como o Observatório das Metrópoles, coordenado pela IPPUR-UFRJ, por meio da pesquisa “Metropolização e Megaeventos: impactos dos Jogos Olímpicos/2016 e Copa do Mundo/2014″. Também vinculada a esse tema, Gordilho participa da pesquisa -”Metrópoles na Atualidade Brasileira: A Região Metropolitana de Salvador”, Projeto PRONEX-FAPESB – parceria com o Mestrado em Planejamento da UCSal, também iniciada em 2011.
E, por fim, a elaboração da proposta e implementação de um Núcleo de Assistência Técnica em Arquitetura, Urbanismo e Engenharia, na FAUFBA, por meio de um curso de especialização em Habitação e Direito à Cidade. O núcleo deverá funcionar semelhante a uma residência profissional da área de medicina, mas neste caso voltado para pequenos municípios e comunidades carentes de tais serviços.
* Marilúcia Leal é estudante de Jornalismo da Facom/UFBA e bolsista da Agência Ciência e Cultura.