“Algumas áreas possuem empresas preparadas, mas, no geral, há uma pequena cultura inovadora das empresas, o que deverá melhorar com o constante incentivo a projetos inovadores e recursos de financiamento”, Alzir Mahl.
POR LUANA ASSIZ*
luanassiz@gmail.com
O Parque Tecnológico da Bahia inaugurado em abril de 2012, sete anos após a apresentação do projeto pela Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia (SECTI). O empreendimento ocupará uma área de 581 mil m², pouco mais da metade do espaço previsto inicialmente, distribuídos em 83 lotes, sendo 22 públicos e 61 privados. O objetivo é estimular a inovação, em um ambiente comum a empresas, universidades e instituições de pesquisa.
Para cumprir tal promessa, a também chamada Tecnovia recebeu da SECTI investimentos superiores a R$ 50 milhões em obras de infraestrutura e equipamentos. Além desse valor, já estão garantidos R$ 28,9 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a segunda etapa do Parque (o Complexo de Equipamentos Dinamizadores) e aproximadamente R$ 23 milhões do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação e Governo do Estado para a compra de equipamentos dos laboratórios de pesquisa.
Por enquanto, estão confirmadas no Parque as empresas IBM, Indra Brasil, Portugal Telecom Inovação e Sábia Experience, classificadas por chamamento público. Da academia, irão participar do projeto instituições públicas de pesquisa, como a Universidade Federal da Bahia, o Instituto Fraunhofer – parceria firmada recentemente com a Alemanha, a Universidade Estadual da Bahia e o Instituto Federal da Bahia, além de SENAI-CIMATEC II, Bahiafarma, CETENE II e mais 10 empresas incubadas.
Mas será que as empresas baianas estão prontas e dispostas a investirem em inovação? Para o coordenador da área de Apoio à Melhoria da Competitividade Empresarial da Diretoria de Inovação da Fundação de Amparo à Pesquisa a Bahia (FAPESB), Alzir Mahl, “algumas áreas possuem empresas preparadas, como TIC [Tecnologias da Informação e Comunicação] e engenharias, mas, no geral, há uma pequena cultura inovadora das empresas, o que deverá melhorar com o constante incentivo a projetos inovadores e recursos de financiamento”.
Tais incentivos são de responsabilidade da FAPESB que, de 2008 a 2010, apoiou 94 projetos de empresas privadas, 50% delas de porte micro, por meio de editais. O aporte destinado a essas companhias somou neste período mais de R$ 28 milhões. “Também financiamos bolsas de pesquisa de empresas e instituições que irão se instalar no Parque Tecnológico, em cujo Comitê Gestor estamos presentes, além de colaborarmos em atividades de planejamento desse projeto da SECTI de quem somos parceiros”, detalha Alzir Mahl. As áreas consideradas prioritárias para a concessão das bolsas para o Parque são biotecnologia e saúde; energia e engenharias; e tecnologias da informação e comunicação.
Para o titular da SECTI, Paulo Câmera, “o Parque Tecnológico da Bahia será um grande fomentador de geração de patentes por abrigar instituições e empresas com foco em inovação”. A aposta tem respaldo: o Tecnocentro terá um escritório de patentes voltado para as empresas participantes da incubadora.
O incentivo é necessário num estado que ainda não tem uma cultura voltada para a proteção industrial e intelectual. De 2007 a 2011, o Brasil registrou aumento de 22% nos pedidos de patentes, alcançando 31.924 depósitos. No mesmo período, a Bahia ampliou os depósitos em 37%, mas o número total de projetos protocolados em 2011 (129) foi irrisório no contexto nacional.
O cenário vem mudando, entretanto, desde a promulgação da Lei de Inovação, em 2004, a partir de quando o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) passou a atuar em todos os estados e não apenas no Rio de Janeiro, onde fica a sua sede. Ainda assim, a estrutura ainda precisa ser incrementada. O escritório que representa a Bahia, instalado em Salvador, conta com equipe reduzida. “Aqui, o custo do escritório é de R$ 8 mil por mês e a estrutura é mínima: eu fico responsável por tudo, desde o encaminhamento dos pedidos até a realização de palestras e o atendimento aos inventores”, relata o responsável pelo escritório local, Flávio Moreno.
É ele quem representa o INPI na orientação dos inventores para o depósito de patentes, mostrando quais são as especificações técnicas para a redação do pedido. Ainda assim, é muito comum haver depósitos com erros ou inadequações técnicas. “Mas não podemos devolver o documento, porque se fizermos isso, há o risco de, enquanto o inventor estiver corrigindo o texto, outra pessoa entregar um projeto semelhante e aí a primeira pessoa perde a patente, porque não haverá novidade quando ela devolver o documento com as correções solicitadas”, explica.
Por causa dessas dificuldades, os inventores independentes são orientados a buscar parcerias com instituições já consolidadas. O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial da Bahia (SENAI/BA) presta esclarecimentos sobre isso e a orientação é clara: “É mais vantajoso licenciar para a indústria, fazer parceria. Ganha-se muito mais. Depositar patentes sozinho, sem apoio, é mais complicado. É preciso saber valorar o produto desenvolvido e fazer uma boa negociação da tecnologia, uma área complexa e cuja consultoria é cara afirma a coordenadora do Núcleo de Propriedade Intelectual do SENAI, Maria do Carmo. Ela explica que o investimento total do depósito de uma patente chega a R$ 15 mil.
Criado em 2006, o setor começou a depositar as primeiras patentes em 2008 e atualmente, conta com dezesseis pedidos de patentes protegidos no INPI e desse número, sete estão protegidos no Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT, na sigla em Inglês), que permite que o pedido feito no Brasil seja enviado para outros países. Até o fim deste ano, a expectativa é dobrar o número de pedidos, todos eles resultantes de tecnologias desenvolvidas por empresas associadas ao SENAI.
A universidade também tem investido nesse setor através dos Núcleos de Inovação Tecnológicas (NITs). Na UFBA, esse trabalho começou em 2005, com a criação de um conselho formado pelos pesquisadores mais atuantes. “Convidamos pessoas bem conceituadas na universidade e na sociedade, em cada grande área do conhecimento, como Manuel Barral e Edvaldo Brito, por exemplo. Em paralelo, começamos a interagir com o governo do estado e sugerimos a criação da rede de propriedade intelectual do estado”, lembra a coordenadora do NIT/UFBA, Cristina Quintella.
O Núcleo, um dos 36 que compõem a Rede NIT Nordeste, desenvolve estratégias de incentivo como o Prêmio Inventor UFBA, que contempla todos os que protocolaram através do NIT. “O resultado é muito bom. O prêmio não estabelece o inventor do ano, mas os melhores, que estão acima do patamar estabelecido pela universidade”, explica Quintella.
Em sala de aula, o tema propriedade intelectual é abordado na UFBA em quatro disciplinas – tanto na graduação quanto na pós-graduação -, nas quais os estudantes aprendem questões como escrever patentes e noções de prospecção tecnológica. Quintella conta que “em uma das disciplinas, nós dividimos a classe em grupos, propondo que os detentores de patentes negociem o valor dessas patentes no mercado”.
O resultado dessas ações se reflete nos números: em 2005, a UFBA protocolou apenas dois produtos tecnológicos no INPI e nenhum por meio do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT, na sigla em Inglês). Em 2010, esse número aumentou para 22, dois deles via PCT, o dobro do registrado em 2009. E no ano passado, 17 patentes foram protocoladas, duas delas no exterior.
A doutoranda em biotecnologia pela RENORBIO-Universidade Federal da Bahia, especialista em Distúrbio do Sono, Kenya Felicíssimo, faz parte dessas estatísticas. Com apoio do NIT/UFBA, que lhe concedeu o Prêmio de Inventora Indepenente 2010, ela desenvolveu um produto protegido pelo INPI: um aparelho intraoral para tratamento do ronco e apneia do sono.
“A minha inovação veio para auxiliar o processo de adaptação pelo usuário, antes de confeccionar um produto definitivo. O aparelho que patenteei será industrializado, ou seja, terá um tamanho único, mas com um material que poderá ser individualizado por cada usuário antes do uso. Isso foi resultado de uma pesquisa sobre o formato, o encaixe, os materiais que possuem essas condições e podem ser usados na boca”, explica. Ainda não há previsão para a chegada do aparelho ao mercado, o que depende da negociação com as empresas, mas existe uma estimativa quanto ao valor dessa tecnologia, cujo custo deve ficar em torno de R$ 50.
*Luana Assiz é jornalista (Facom-UFBA) e especialista em Jornalismo Científico e Tecnológico pela mesma faculdade.