A visão do Estado sobre a Ciência preocupa pesquisadores e cientistas no país. Atitudes como o tratamento dispensável em tempos de crise financeira por parte do Governo impõem ao país um outro olhar sobre duas das áreas que mais trazem benefício a toda a humanidade
GILBERTO RIOS ALVES NETTO*
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“Estamos em um país que impõe sete prioridades para o Ministérios da Ciência e Tecnologia, para a promoção da Inclusão Social. O problema é que quem tem tantas prioridades, acaba por não ter prioridade nenhuma. Não tem foco”, problematizou Olival Freire Júnior, durante a Conferência “Ciência & Tecnologia no Brasil: o Discurso e a Prática”, promovida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb).
Em sua palestra, o pós-doutor pela Universidade de Massachusetts, pela Universidade de Paris VII, professor da Universidade Federal da Bahia, e coordenador do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia também destacou a importância de se conhecer a trajetória da Ciência no país para a definição de diretrizes para o presente e futuro.
Embora acredite no potencial criativo e técnico do país para a promoção da Ciência e Tecnologia, o professor advertiu que a área não recebe a devida atenção do Estado. “Não é difícil perceber que, sempre que o país alega passar por crise financeira, a primeira área que para de receber financiamento é esta”, sinalizou.
Frente a isso, o Freire Jr interpela: “quando o Brasil saberá definir prioridades para essa área? E quais as políticas de Ciência e Tecnologia devem ser desenvolvidas em tempos de crise?”.
Resgate histórico
“O resgate histórico da Ciência no Brasil é análogo ao resgate histórico que a gente faz da história da nação brasileira”, constatou. É no campo da História da Ciência que Freire Júnior desenvolve os projetos “Ciências na transição do século: conceitos, práticas e historicidade” (desde 2010) e “Ciência e política durante o regime militar: As transformações na comunidade brasileira de físicos” (desde 2007).
O seu projeto mais recente, desenvolvido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb), tem como objetivo identificar as transformações da produção científica nos campos das ciências naturais e das exatas, no final do século XX, investigando as migrações de conceitos, práticas e pesquisadores entre essas áreas. Este estudo histórico e epistemológico será a base para o exame de posições correntemente adotadas em estudos sobre a ciência e de implicações em ensino de ciências.
Regimes políticos e desenvolvimento científico
O estímulo à Ciência e Tecnologia, no Brasil, iniciou em meados do século passado, e apresentou progressivo avanço até os dias atuais. Segundo Freire Júnior, os principais períodos de crise, enfrentadas pelo campo científico brasileiro, ocorreram durante as décadas de 50 e 60, em decorrência da falta de investimentos no setor. Sem dar amparo às pesquisas, os mandatos dos presidentes Juscelino Kubitschek (1956-1961), Jânio Quadros (1961) e João Goulart (1961-1964) propiciaram um dos mais decepcionantes eventos da história do país para a área científica: a saída de cientistas brasileiros para o exterior, em busca de financiamento para seus projetos.
“Só entre os anos de 1969 a 1976 que o Brasil começa a voltar os olhos à produção [científica] no país”, atentou o pesquisador. Ele explicou que foi a partir de medidas como a Reforma Universitária, a criação da carreira docente, o pagamento de bons salários para magistrados e a instalação de pós-graduações (que, ainda hoje, é considerado um dos melhores patrimônios da Ciência brasileira) é que fariam emergir um fértil terreno para o desenvolvimento acadêmico. “Isso é algo comum entre regimes totalitários: estimula-se a ciência e a tecnologia visando expressar a soberania do Estado”, contextualizou Freire Jr.
Todo o levantamento realizado entre os anos de 1964 e 1984 – que corresponde ao período da Ditadura Militar no Brasil – está em sua pesquisa iniciada em 2007, sobre a relação do regime militar com as transformações da comunidade brasileira de físicos. A pesquisa recebe o patrocínio conjunto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e da Fapesb.
* Gilberto Rios é estudante de Jornalismo da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia e bolsista da Agência de Notícias Ciência e Cultura.