Pesquisa desenvolvida na Escola Politécnica da UFBA promove melhoramentos nas estruturas da argila. O beneficiamento atribui um valor comercial até 100 vezes maior e possibilita o emprego do mineral modificado em indústrias como a farmacêutica. Os trabalhos são realizados por uma equipe de dez alunos de iniciação científica, mestrado e doutorado, acompanhados pelo professor.
POR AILTON SENA*
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Considerado um mineral abundante no território brasileiro, as argilas tem seu uso bastante atrelado à indústria da construção civil e à produção de objetos cerâmicos. Mas, o projeto desenvolvido pelo professor da Escola Politécnica da UFBA, Márcio Nascimento, que promove melhoramentos nas estruturas do mineral pode ajudar a ampliar o seu horizonte. De acordo com o pesquisador, o beneficiamento atribui um valor comercial até 100 vezes maior e possibilita o emprego do mineral modificado em indústrias como a farmacêutica. Os trabalhos são realizados por uma equipe de dez alunos de iniciação científica, mestrado e doutorado, acompanhados pelo professor.
Relatório do Ministério das Minas e Energias, de 2009, atesta a existência de 417 minas de argila em operação no país, com produção variando de 1.000 a 20.000 toneladas/mês. Na Bahia, a quantidade de minas ainda não foi totalmente computada. Mas de acordo com o Departamento Nacional de Produção de Minas (DNPM), 71 empresas exploraram argilas no estado em 2011. O que não significa a existência de 71 minas, pois, uma mesma empresa pode explorar mais de uma jazida. A produção anual do mineral no estado, ainda segundo o DPNM, é de 256 mil toneladas que, em 2011, foi estimada em R$3,5 milhões pelo valor base para cálculo da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM).
O uso dos minerais argilosos é categorizado em dois grupos: argilas especiais e argilas comuns. Segundo dados do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), 90% da argila produzida no país se destina ao segundo uso, que envolve a fabricação de agregados materiais de construção. Os 10% restantes, destinados aos “fins especiais”, têm variada aplicação, que inclui absorventes, tintas, papel, borracha, desodorantes e produtos químicos e farmacêuticos. Esses 10% da produção, ainda segundo informações do CPRM responde por 70% do faturamento com o produto.
De acordo com artigo dos professores Antônio Vieira, Pérsio de Souza e Helena de Souza, todos da Universidade de São Paulo (USP), a expressão “Argilas Especiais” foi introduzida e está correntemente sendo utilizada pela revista inglesa Industrial Minerals, desde 1985, para designar um grupo de argilas que se distingue das “Argilas Industriais” por ser comercialmente raras, ocorrerem em quantidades grandes em localidades restritas, por serem produtos industriais modificados quimicamente e, por isso, possuírem elevado valor agregado. De acordo com os pesquisadores, até o momento eram sabidos dois casos de depósitos de argilas especiais no Brasil, ambos esgotados. O artigo fora publicado em 2007.
Rentabilidade
A purificação e a modificado na estrutura das argilas propostas pelos Processos de Tecnologias (Protec), através do Grupo de Pesquisa em Materiais, agregaria ao mineral um considerável valor de mercado. “Em termos comerciais, se compram essas argilas por centavos de dólar a tonelada. E, chegamos a importar o Brasil entre outros países, essas mesmas argilas modificadas por algum processo físico-químico onde elas passam de centavos de dólar a dezenas ou centenas de dólar”, explica Nascimento, coordenador do Grupo.
O mineral modificado teria seu emprego direcionado a “fins especiais”, sem descartar a possibilidade de serem usados, por exemplo, em indústrias petroquímicas. “Se conseguirmos obter novos materiais, como uma argila modificada, por exemplo, certamente apresentará algumas propriedades interessantes. Realizamos alguns testes com resultados muito animadores ao purificar argilas baianas utilizando apenas água (reutilizável). Conseguimos retirar varias impurezas e material orgânico de forma relativamente simples. Só que este processo pode deixar um tijolo feito deste material muito caro. A intenção é incorporar estas argilas purificadas em materiais mais nobres, aumentando o valor agregado do produto final, por exemplo, em certos polímeros”, avalia. Uma outra pesquisa, por exemplo, utilizando argilas similares, criou um produto a base de polímeros com textura próxima a da pele humana, que facilitou a produção de pequenas próteses, como ouvido e nariz muito mais baratas que as importadas – e aplicada em hospital publico de Pernambuco.
O projeto de pesquisa desenvolvido tanto no Instituto de Humanidades, Artes e Ciências como na Escola Politécnica da UFBA não é de todo uma novidade, pois a argila é um material abundante em território nacional. Modificações na estrutura da argila já foram propostas de outras por outros pesquisadores brasileiros. Na Universidade Federal de Pernambuco(UFPE), o professor Manfred Schwartz coordenou a pesquisa “Produção de materiais a partir de barro e/ou argilas modificadas”. Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a professora Maria Inês Bruno Tavares também desenvolve pesquisas na área. E na USP, o professor Érico Teixeira Neto possui publicações em argilas. O que, segundo o professor Márcio, diferencia o projeto são os materiais iniciais de trabalho (argilas paraibanas, paulistas e baianas têm composições diversas), as diferentes modificações e melhoramentos efetuados, entre outros detalhes técnicos bem como suas mais diversas aplicações, que devem ser protegidos por meio de patentes.
*Ailton Sena é estudante de jornalismo da Facom/Ufba