No Brasil, mais de 800 mulheres morrem todos os anos por complicações na gravidez, parto e pós-parto.
POR JANE EVANGELISTA*
janeevangelista@gmail.com
Todos os anos, em todo o mundo, forma-se uma legião de recém-nascidos que nunca ouvirão canções de ninar nas vozes daquelas que lhe deram a vida, nunca receberão um afago, uma carícia ou serão amamentados por elas. São os órfãos das mais 300 mil mulheres que morrem por complicações na gravidez, parto e pós-parto.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 1000 mulheres morrem por dia em todo o mundo. As mortes são mais frequentes nos países em desenvolvimento, evidenciando o lado cruel da saúde destinada as populações mais pobres. Apesar de a mortalidade materna ter diminuído em todo o mundo – de cerca de 585 mil, em 1990, para 358 mil, em 2008 – os números ainda são inadmissíveis.
De acordo com a OMS, a mortalidade materna é a morte feminina ocorrida no período da gestação ou até 42 dias após o parto, não importando a duração ou a localização da gravidez, morte causada ou agravada pela gravidez. Ainda de acordo com a OMS, a morte materna tardia é aquela ocasionada ou agravada pela gravidez, que pode acontecer num período superior a 42 dias após o parto e inferior a um ano após o parto.
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Na Bahia, a razão de mortalidade materna por causas diretas, em 2010, foi de 61,7 óbitos maternos/100.000 nascidos vivos, mas o valor corrigido, que calcula um percentual para os casos subnotificados, foi de 71,6 óbitos maternos /100.000 nascidos vivos. A média do Estado é superior à média nacional. Segundo dados do Ministério da Saúde (MS), em 2010, a taxa de mortalidade materna no Brasil foi de 68 óbitos maternos/100.000 nascidos vivos.
A razão da mortalidade materna no Brasil tem tido uma tímida diminuição, apesar das iniciativas do governo brasileiro com a criação de alguns programas, políticas e se tornando signatário de tratados internacionais para a redução da mortalidade materna. O número de mulheres que morreram no primeiro semestre de 2011, 705, foi 19% menor que no mesmo período de 2010, quando foram registrados 875 mortes de mulheres por consequências do período gravídico-puerperal (período entre a gravidez, o parto e o pós –parto). As razões de mortalidade materna nacional e estadual permanecem acima do que é considerado aceitável pela a OMS: entre 10 e 20 mortes maternas/100.000 nascidos vivos.
“Iniciativas do Ministério da Saúde como os programas PAISM e PHPN, além do Pacto Nacional, que representa mais do que um programa e sim a política do Estado brasileiro para enfrentamento da mortalidade materna, são referências importantes, porque são o reconhecimento da gravidade do problema e a necessidade de seu controle, mas não conseguiram plena efetivação”, afirma Greice Menezes, pesquisadora do Programa de Estudos em Gênero (MUSA) e Saúde e professora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Evitável em 90% dos casos, a morte materna é uma violação dos direitos humanos das mulheres. Sendo importante indicador para se compreender a qualidade da assistência médico-sanitária prestada a uma população, reflete a pobreza, as desigualdades de gênero, as precárias condições socioeconômicas, o baixo grau de informação e de escolaridade de uma sociedade. Além de evidenciar o lugar que a mulher ocupa em uma determinada sociedade.
“As mortes maternas são produzidas socialmente, porque expressam a exclusão social de mulheres, em que desigualdades de classe social, gênero, raça/etnia e geração se articulam, penalizando as mais jovens, pobres, negras. O perfil das mortes é portanto conhecido. Morrem mulheres pobres, pouco escolarizadas, de raça/cor negra, residentes nos bairros periféricos das cidades, onde há menor acesso aos bens e serviços, inclusive os de saúde”, declara Menezes.
Outro evento tão grave quanto à mortalidade materna é a morbidade materna grave (near miss – eventos de quase morte materna). A near miss e a mortalidade materna são eventos semelhantes, porém os primeiros ocorrem com maior frequência.
*Jane Evangelista é jornalista e especialista em Jornalismo Científico pela UFBA.