Guilherme de Oliveira Brockington, doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) utiliza métodos neurocientíficos para investigar quais os mecanismos corporais ativados no momento de aprendizagem e explorar o papel da emoção na construção do conhecimento científico.
GILBERTO RIOS*
gilberto.rios13@gmail.com
O icônico personagem Spock, do seriado Star Trek, já afirmava que as emoções dele “são patéticas”, afinal ele é um cientista. Fora da ficção, não é incomum pensar o cientista como um ser guiado exclusivamente pela razão, característica que o põe num outro patamar em relação às pessoas comuns, meros mortais reféns de suas emoções. Mas não é isso que acredita José Guilherme de Oliveira Brockington, doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). O pesquisador utiliza métodos neurocientíficos para investigar quais os mecanismos corporais ativados no momento de aprendizagem e explorar o papel da emoção na construção do conhecimento científico. Sua apresentação integrou o quadro de participação do Café Científico no segundo dia da ACTA-2012 (16.10), às 15h, no auditório do Pavilhão de Aulas da Federação III da Universidade Federal da Bahia (PAFIII/Ufba).
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“O que acontece no cérebro da gente que faz com que sejamos capazes de compreender física, matemática e ciências em geral?”, indagou o pesquisador ao início de sua apresentação. Brockington – que desmaiou ao ver, pela primeira vez e pessoalmente, um cérebro humano – fez comparações entre imagens de ressonância magnética do cérebro de diferentes indivíduos. Participaram do estudo pessoas que não apresentavam anormalidades para o aprendizado comum e eram interessadas em aprender; outra que não dava a mínima atenção para o que lhe era ensinado e de outra pessoa com dislexia – transtorno que dificulta a aprendizagem gramatical. Quanto mais eficiente em aprender era o sujeito que gerou as fotos, mais uma determinada área de seu cérebro “acendia”, mostrando que ali agiam as unidades do corpo responsáveis pela transmissão do conhecimento. E o resultado: os que mais se emocionavam eram os que mais aprendiam.
Guardado no topo do corpo humano, o cérebro é o órgão responsável por “dirigir e gerenciar” todas as atividades corporais. Pesando, em média, um pouco mais de um quilo em adultos, é nele onde são processadas “as mais complexas belezas que existem para os humanos: raiva, amor, compaixão… enfim, as emoções”, enumerou Brockington. Fascinado por esse órgão, chegou a falar sobre curiosidades dele: “se desdobrado, ocuparia uma área de mais de um metro e, embora represente apenas 2% da massa corporal, consome 20% da energia do corpo”. O cérebro se conecta com restante do corpo pelos neurônios, células especializadas responsáveis pela transmissão da mensagem. Em conjunto, essas estruturas captam sinais do meio ambiente e dão sentido a eles. Hoje, pesquisadores da UFRJ estimam existir cerca de 90 a 100 bilhões de neurônios. “Se o número de neurônios fosse o número de árvores da Amazônia, as sinapses correspondem ao número de folhas”, sinaliza o pesquisador. Por sua vez, as sinapses são os pontos de conexão entre um neurônio e outro.
Mas o cérebro é um órgão seletivo. “Qualquer coisa que você aprenda, significa matar neurônio”, expõe Brockington. O pesquisador explica que por esse motivo, aquilo a que somos expostos “faz uma diferença brutal na forma como a gente vê o mundo”. Uma série de pesquisas mostra o papel da emoção na consolidação da memória. Uma delas, apresentada pelo pesquisador, consiste no seguinte: três grupos de pessoas decora uma lista de palavras negativas, uma lista de palavras neutras e outra de palavras positivas. Então, um grupo assiste a filmes deprimentes, um vê filmes alegres e outro vê filme que não tem distinção emocional. Ao final do estudo, os cientistas perceberam que essas pessoas tendiam a decorar as palavras que tinham a ver com o gênero do filme. Realizada pelo médico e pesquisador francês Stanislas Dehaene, outra pesquisa – intitulada How learning to read changes the cortical networks for vision and language (Como aprender a ler muda o funcionamento cerebral para visão e linguagem) – mostra, em gráficos, as diferentes áreas do cérebro que são ativadas quando pessoas analfabetas e letradas ativam quando veem imagens de rostos, lugares, objetos e letras. “Pesquisas como essas reforçam a existência da diferenciação no mecanismo cerebral entre pessoas que aprendem algo e ou deixam de aprendê-lo”, resume Blockington.
“Qual a pergunta que o educador tem que fazer ao neurocientista?”, questionou o pesquisador no início da elaboração de seu projeto. Para ele, nosso cérebro cria barreiras lógicas para a compreensão da Física, como no caso de responder se o que cai primeiro é a pedra ou a pena, explicitando haver um “abismo entre a pesquisa e a prática docente”. Em um experimento simples, analisou a reação de físicos e outros profissionais para saber quais as suas reações ao ver fotos de Angelina Jolie, Brad Pit, o pôr do sol, uma criança em situação extrema de fome, a Monalisa (de Da Vinci)… e a fórmula da relatividade de Einstein. Comparando os resultados, pôde perceber que o cérebro dos físicos ou das pessoas que gostavam de física reagia muito mais quando era submetido à imagem da fórmula. O padrão foi mantido nas outras figuras: todos os submetidos reagiam mais às imagens que preferiam.
“Conhecimento dá barato, ajuda explicar o mundo e isso é emocional. Se aquilo não bate no meu estômago e eu não internalizo, eu não consigo entender”, explanou Brockington, atentando para a necessidade de pensar métodos pedagógicos que aproximem as Ciências dos estudantes como o meio mais eficaz de ensinar disciplinas consideradas complexas como a Física. “A gente só aceita a explicação se aquilo for emocionalmente convincente”, conclui o pesquisador.
* Gilberto Rios é bolsista da Agência de Notícias Ciência e Cultura, estudante de Jornalismo na Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Facom-Ufba) e integrante do grupo de pesquisa Cultura e Sexualidade (Cus) na mesma universidade.