Engenheiros e arquiteta repensam a forma habitual de construção civil
POR GILBERTO RIOS*
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“Entre 50% a 70% de todos os recursos mundiais são destinados à construção”. Essa informação, fundamental para os profissionais de Arquitetura ou Engenharia que pensam em preservação do meio ambiente, ficou evidente nas apresentações dos professores Ricardo Carvalho, José de Lima e Cybele Celestino realizadas ontem, quarta-feira (02/05), no auditório da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Os pesquisadores estiveram reunidos para falar sobre Técnicas Construtivas e Materiais Sustentáveis a uma plateia formada por estudantes e professores das áreas.
Ricardo Fernandes Carvalho é engenheiro civil, doutor em Ciência e Engenharia de Materiais pela Universidade de São Paulo e, atualmente, integra o Departamento de Construção e Estruturas da UFBA. Em sua fala, Carvalho se posicionou contra a ideia de que a sustentabilidade inviabiliza o desenvolvimento humano, como parecem acreditar muitos dos grandes empresários focados em questões econômicas. “Propor algo que integre o desenvolvimento econômico, social e ambiental é o pilar para qualquer projeto de respeito que se diga sustentável”, defendeu.
O professor atenta que o problema da urbanização no Brasil é iniciado na década de 1930, mas se intensifica entre os anos 1940 a 1980. Grande parte desse crescimento não foi planejada e acarretou no preenchimento desigual e problemático do espaço urbano atual do país. No século XXI, a população urbana representa 82% do percentual populacional nacional. Portanto, não se pode mais pensar em devastar o que foi construído em prol de um novo projeto de urbanização, mas nas dimensões e conexões que envolvem esse território, como os meios de transporte e os materiais usados nas novas construções.
Carvalho defende a instalação de sistemas de reciclagens que possibilitem a reutilização de materiais descartados no processo na construção civil. “60% da melhor terra cultivável que é deixada de ser utilizada para a agricultura é destinada à construção e 70% de todos os produtos de madeira são destinados às construções”, explica. Os materiais usados atualmente percorrem um ciclo: depois de recolhidos enquanto matérias-primas são transformados em produtos que servem para as construções e, posteriormente, são descartados quando ocorre um processo de reforma. O impacto seria menor se fosse implantado o sistema de reciclagem.
José Antonio Ribeiro de Lima, segundo palestrante da noite, trabalha em consultoria na área de gestão de resíduos, é colaborador no Grupo de Resíduos Sólidos do Departamento de Engenharia Ambiental da Universidade Federal da Bahia e professor de Engenharia Civil da Faculdade Área 1 de Salvador. O pesquisador apresentou a pesquisa de doutorado que desenvolveu na Universidade de São Paulo, intitulada “Avaliação das consequências da produção de concreto no Brasil para as mudanças climáticas”.
Ribeiro defende que o concreto brasileiro contribui para as mudanças climáticas devido às intensas emissões de dióxido de carbono (CO2) à atmosfera. O setor cimenteiro representa 5% das emissões de CO2 provocadas pelo homem. Isso acontece porque, na fabricação do cimento, é necessário gerar bastante calor, o que exige o investimento de muita energia. Estima-se que em 2100 haja um aumento previsto de 2% a 4% do percentual de emissão de CO2 em relação a 1990. O dado pode ser assustador, mas representa a metade da energia que era utilizada na década de 1970. Para Ribeiro, é preciso repensar a forma como o cimento é aplicado em qualquer construção, da de menor porte à maior, justamente visando a redução do uso de cimento.
Pesquisadora defende uso da terra como material básico em canteiros de obra
A última apresentação da noite ficou a cargo da professora de arquitetura da UFBA, Cybele Celestino Santiago. A professora apresentou seu trabalho nomeado “Construções sustentáveis: terra”, no qual propõe que a terra deixe de ser base para as construções para ser material de fato. Ela explica que ainda há preconceito quanto ao uso da terra como material básico em canteiros de obra. “O preconceito que dita que ‘quem usa terra é pobre’ cria na população a repulsa pelo material porque ninguém quer ser assimilado à imagem da precariedade”, disse.
Além disso, as escolas de arquitetura deixaram de conscientizar os alunos para a escolha das normas. A pesquisadora destaca o exemplo do parâmetro da espessura das paredes que é de 15 centímetros. “Os alunos e mesmo os profissionais esquecem que esse parâmetro é utilizado apenas para cimento. Repensar isso implica repensar o modo de fazer/ensinar arquitetura”, afirma.
Santiago esclarece que há disparidade quanto ao tratamento da terra como material sustentável. Em tese, o uso da matéria-prima não abrangeria todos os nove paradigmas de sustentabilidade pautados por alguns órgãos internacionais, como o BREEM, o GREEN STAR, o LEED e o HQE. Para a professora, mesmo sem o reconhecimento desses órgãos, a utilização de terra como material sustentável traz mais vantagens que desvantagens.
Entre os pontos positivos, estão: a vasta disponibilidade; reduzida energia na fabricação; propicia a reciclagem; não produz lixo nem resíduos; conforto térmico e acústico; baixo custo de produção; e comprovadamente material durável. Já entre as desvantagens, estão: degradação quando em contato com água; baixa resistência mecânica; necessidade de tempo para ensaios e limitação em termos de altura total; elevadas espessuras de paredes, o que diminui o espaço de utilização do terreno; necessidade obrigatória de planejamento antes da construção; preconceito; e falta de financiamento.
* Gilberto Rios é estudante de Comunicação – Jornalismo da Faculdade de Comunicação, na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e bolsista da Agência de Notícias Ciência e Cultura -UFBA.
Este dado é realmente impressionate: “Entre 50% a 70% de todos os recursos mundiais são destinados à construção”.
Muito bom o artigo!