Em sua pesquisa que gerou a tese “Teto de Vidro”: relações de gênero, relações de poder e empoderamento das mulheres na Polícia Militar, Laudicéia Soares de Oliveira, identifica os fatores que impedem as policiais militares de chegarem aos cargos mais elevados do oficialato.
POR EMILE CONCEIÇÃO*
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Laudicéia Soares de Oliveira, doutora em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo em sua tese de doutorado, “Teto de Vidro”: relações de gênero, relações de poder e empoderamento das mulheres na Polícia Militar, problematiza a conquista de espaço das mulheres na PM. Segundo Oliveira, as policiais ainda não conseguem chegar aos cargos mais elevados do oficialato. Além disso, mostra a necessidade da implantação de políticas sociais destinadas a reverter, ou pelo menos amenizar, esse quadro.
Já que o acesso aos altos cargos da PM é obtido através de concursos públicos ou nomeação por tempo de serviço e não há nenhuma especificidade legal que proíba as mulheres de ocuparem tais funções, os motivos para esse “desempoderamento” feminino, como cita a autora, deve ter causas sexistas. A primeira justificativa dada por Laudicéia para o fato, está no histórico da instituição que é fechada e patriarcal. Logo, estabelece-se uma hierarquia na qual os homens estão sempre no topo. Desde o ingresso das mulheres à polícia os trabalhos para elas destinados foram o burocrático ou casos relacionados a outras mulheres e menores. Isso por causa do preconceito de as mulheres serem frágeis, fracas e supostamente inaptas para o trabalho ostensivo.
Os dados mostram que apenas 1,6% dos homens compõem o contingente dos cargos mais elevados, como coronel, tenente-coronel e major. Entretanto esse número torna-se muito elevado quando comparado com o de mulheres, 0%. A graduação mais alta ocupada por mulheres na PM é a de Capitã, o que corresponde a 0,52% do contingente de policiais da PM baiana. Cargos como tenente e aspirante a tenente também são ocupados pelas policiais. Mas é na função de menor escalão, soldado, que o número de mulheres é mais elevado, 10,13% do contingente feminino da PM, seguido da graduação de sargento com 2,2%. Tomando como base o efetivo total de policiais, a quantidade de mulheres que exercem funções de oficialato é de 0,8% e a quantidade de homens é de 6,2%.
Apesar do número de mulheres na Polícia Militar ter crescido nos últimos anos, isso não significa que elas tenham conquistado um espaço igualitário na instituição. Pelo contrário, o status de inferioridade ainda persegue as oficiais. Vista a dificuldade em se obter um crescimento profissional dentro da PM, muitas policiais se conformam ou ficam indignadas com a situação, mas não fazem muita coisa para alterá-la. O depoimento da sargenta Assunção, uma das componentes do primeiro grupo de mulheres da PM/BA, mostra um pouco da indignação dessas mulheres. “Acho que as mulheres não têm vez para crescer na PM, porque desde o início a chegada da gente foi para turista ver e para mostrar para a sociedade que a instituição tinha mudado…”, protestou.
Oliveira fala também da sutil vigilância que as policiais sofrem. Além do “olhar hierárquico” sob o qual todos os oficiais estão sujeitos, as mulheres estão também na mira do “olhar sob um gênero”. E isso não só dos seus superiores, mas dos homens em geral. Há a chamada “hierarquia de gênero”. O problema se agrava ainda mais quando diz respeito aos negros e pobres, revela uma “hierarquia social e étnico/ racial”. A tese aponta que 80% dos homens negros entrevistados disseram haver práticas racistas no interior da PM. O percentual de homens brancos ocupando os altos cargos é de 83,3% e o de negros é de 16,7%. Quanto às mulheres, não há uma sequer. “Ser mulher é matar um leão por dia. Ser mulher negra é matar dois. E ser mulher negra e pobre é matar três leões por dia.”, diz a sargenta Portinari.
A autora termina chamando a atenção das policiais que, em vez de utilizarem sua presença como “arma política”, se acomodam e até mesmo reproduzem o discurso machista. Ela ainda diz que “a PM reinterpreta, reproduz e reorganiza uma história cultural já estabelecida: a de que há alguns setores da esfera social onde não há ‘total’ espaço para as mulheres”.
* Emile Conceição é estudante de jornalismo da Facom-UFBA.