Pesquisadores baianos analisam a atual conjuntura política do Brasil e indicam as projeções para a esfera política nos próximos anos
POR LARISSA SILVA*
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O debate acerca da reforma política brasileira, discutida e rejeitada há dois anos, voltou à tona nesta semana. A proposta em questão altera as eleições em lista aberta, em que o eleitor vota diretamente no candidato ou na legenda do partido, para o voto em lista fechada, no qual se opta por um partido político em vez de um candidato específico. Outra mudança prevista é o financiamento das campanhas eleitorais com dinheiro público.
Os parlamentares a favor da reforma têm pressa de aprová-la até setembro deste ano, para que ela entre em vigor já nas eleições de 2018. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou em entrevista coletiva que considera difícil a consulta popular sobre esse tema pela tecnicidade dele. O pós-doutor em Direito, Wálber Carneiro, alerta que os cidadãos estão se distanciando da política na busca por soluções técnicas, o que os torna submissos.
A Proposta de Emenda à Constituição 55 (PEC 55), que limita os investimentos em saúde e educação pelos próximos 20 anos, foi aprovada sem que houvesse consulta à população. Agora estão em pauta a reforma política e a da previdência, em ambas também não há perspectiva de apelo à opinião pública. Para o doutor em Direito Público, Fábio Hirsch, a ausência de diálogo com a população sobre decisões políticas desrespeita o conceito de democracia. “Falta legitimação social mais direta e constante”, analisa.
Para Carneiro, o debate político precisa ser renovado. “A reinvenção exige a exploração de novos espaços de diálogo e de institucionalização. Isso significa que o direito constitucional precisa ocupar outros espaços”, explica.
Panorama e Constituição - Além da falta de participação popular nas decisões, o contexto político brasileiro é marcado pelo descrédito das instituições oficiais. Dados do relatório Confiança nas Profissões, publicado em 2016 pela GfK Verein, instituto de pesquisas alemão, indicaram que apenas 6% dos brasileiros confia em seus políticos. Este foi o menor percentual entre as grandes economias do mundo.
Carneiro afirma que a política está em descrédito. “E a democracia está na berlinda”, acrescenta. Hirsch, que também é integrante da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-BA, afirma que o pano de fundo da política no Brasil é muito conturbado. No entanto, considera que a legislação brasileira satisfaz a atual conjuntura do país. Segundo ele, a Constituição protege as liberdades fundamentais e a democracia.
Por outro lado, Hirsch critica que a Carta Magna tem sido alvo de frequentes emendas com motivações nem sempre democráticas. O problema maior, segundo ele, está na lacuna entre o que a sociedade espera da lei e a necessidade dela de ser concretizada pelas pessoas. “Há um desprestígio da força e da autoridade da Constituição criado, em especial, pela classe política e por parcela do próprio Poder Judiciário”, analisa.
Projeções – Segundo Wálber Carneiro, essa conjuntura abre espaço para o fortalecimento das forças conservadoras. O especialista explica que elas já existiam, mas agora têm maior ressonância diante da opinião pública.
Na visão de Hirsch, o sistema político brasileiro ficará cada vez mais desprestigiado se não buscar uma nova forma de legitimação.“[O sistema] passará por uma sabatina social muito grande caso não dê os resultados mínimos que a sociedade espera dos seus membros”, antecipa. Essa reformulação do sistema político, para ele, deve ser motivada por pressão social nas ruas de forma organizada e sistemática.
A análise do Procurador da República e mestre em Direito Público, André Neves, aponta que a situação política do Brasil tende a piorar se não houver uma tentativa consciente da população para reverter o quadro atual. “Se não conseguirmos, como sociedade, construir alternativas para que nossas demandas sejam ouvidas, cada vez mais, teremos maior grau de insatisfação com o sistema político”. A saída mais promissora para ele é o investimento no uso de técnicas de participação popular através dos meios digitais.
Carneiro complementa que a mudança precisará de soluções inovadoras, reestruturantes e que dependerão, provavelmente, de reformas constitucionais. “Nessa crise, é preciso reinventar a estrutura do debate político, descentralizá-lo, expandi-lo e fragmentá-lo”, conclui.
*Estudante do curso de jornalismo da Faculdade de Comunicação da UFBA e repórter da Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura