Roda de conversa na Escola Politécnica da UFBA aborda a problemática da violência de gênero no mercado de trabalho e na universidade
POR AMANDA DULTRA
amandadultra@hormail.com
O reflexo da herança secular do papel feminino como secundário ainda é muito presente nos dias atuais e que ainda possibilita transgressões que objetifiquem ou diminuam a mulher. Ainda que existam conquistas sociais através de leis, haverão exemplos de agressões físicas, psicológicas, sexuais, ou mesmo morais – resultando no pior: o silêncio da vítima.
Violências como as retratadas acima acabam também fazem parte da vida de mulheres não apenas no âmbito conjugal, mas também no mercado de trabalho e nas universidades. Dessa forma, o sentimento mais notável entre as participantes do seminário “Violência de gênero: no mercado de trabalho e na Universidade”, era o de cansaço. Mais do que indignação, as faces femininas do Programa de Extensão Tutorada do curso de Engenharia Elétrica da UFBA (PET Elétrica) contavam suas histórias com muita exaustão.
De acordo com a estudante do curso de Engenharia Elétrica Milena Cerqueira, a violência chega de onde menos se espera. “Recentemente, aqui na Poli, a gente recebeu um e-mail de uma vaga de estágio que tinha explicitamente escrito ‘só para homens”, exemplificou num tom quase casual e reforçou: “Como mudar esse paradigma?”
A questão de Milena foi a central levantada durante a tarde de discussão e, ao longo da mesa, muitas vozes se ergueram como a da graduanda de Engenharia Elétrica e também mediadora do evento, Maria Paula Ferreira. “Muitas mulheres negaram participar, não porque não tinham interesse, mas por medo da exposição”, desabafa.
Um problema apontado pela tutora Luciana Martinez foi a ausência das mulheres na pesquisa, talvez intimidadas num ambiente que ainda se mostra agressivo. “Dos estudantes universitários no país, 60% são mulheres; dos de mestrado, 53%, e de doutorado 47%. Pesquisadores A1 do CNPq somos 23%. Eu me questiono por que isso acontece? Se a maioria dos estudantes universitários são mulheres, por que não seguem esse caminho?”
Diante dessa violência estrutural, a maior preocupação é saber como ajudar as vítimas. Infelizmente, os dispositivos legais às vezes provam ser insuficientes. “O que tem de proteção é distorcido e aplicado de uma maneira que nos fragiliza”, é o que afirma a advogada e defensora dos direitos humanos, Luise Reis. Muitas vezes as vítimas de violência não-física não têm um amparo legal, tendo em vista de que a legislação tende a se sensibilizar apenas a situações de extrema, como o feminicídio. “Não tem uma forma ainda legitimada dessas proteções. Dentro de uma reprodução estrutural, a gente precisa de micro-políticas”, reforça Reis.
E onde encontrar a solução para acabar com a violência de gênero nas relações educacionais e de trabalho? O caminho está sendo buscado, mas, ao invés de aumentar o cisma entre os gêneros, a resposta vem da sensibilidade da conversação. “Essa construção é necessária: ninguém vai acordar nenhum dia e deixar de ser racista, não acontece”, problematizou Milena Cerqueira. Ela ainda contou como a sua mãe recusava-se a tolerar sua homossexualidade, porém com o tempo aprendeu a aceitar. Apenas o diálogo, a disposição para o entendimento pode criar pontes para a tolerância. Se a tarde começou num tom sóbrio e amargo, essa terminou com ar de esperança e determinação em reduzir a violência entre gêneros.
*Estudante do curso de jornalismo da Faculdade de Comunicação e repórter na Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura UFBA