Projeto desenvolvido pelo Núcleo de Engenharia de Água e Solo (NEAS) da UFRB propõe o uso de águas salobras no cultivo de hortaliças em sistema hidropônico como alternativa para o semiárido.
POR EDVAN LESSA*
lessaedvan@gmail.com
Diversos municípios baianos têm sofrido com os problemas causados pela seca. Nesse contexto, tecnologias inovadoras, que possibilitam a convivência das populações com a escassez de água, são bastante aplaudidas. É o caso da iniciativa desenvolvida pelo professor Vital Pedro da Silva Paz, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), que prevê a utilização de águas salobras para o cultivo de hortaliças em sistema hidropônico – técnica de cultivo de plantas sem solo, na qual as raízes recebem uma solução com água e todos os nutrientes essenciais para o seu desenvolvimento. O projeto, que inova pela proposta de uso inteligente da água com salinidade elevada é uma alternativa para as populações que vivem na caatinga.
A diminuição quantitativa e a qualitativa dos recursos hídricos nos últimos anos foi um dos aspectos que motivou o pesquisador da UFRB. Segundo Vital Pedro da Silva Paz, o grande objetivo do projeto é associar rentabilidade com qualidade de vida para as pessoas no convívio com a seca, pois nenhum trabalho contra seca ou chuva seria viável. “Não vivemos numa situação permanente de escassez [de água], apesar de ela ser crítica em algumas regiões semiáridas”, acredita.
“No Nordeste, há uma precipitação em torno de 500 e 600mm³, razoável [em relação a outros países com clima semiárido]. [Mas a questão é] como aproveitar essa água que chega via precipitação, e as subterrâneas – apesar de não possuírem grande volume e serem águas de salinidade elevada”, pondera o professor Vital. Ele revela que o maior desafio das recentes pesquisas nessa linha é promover mudanças no uso da água na agricultura, pois essa atividade é a que mais consome os recursos hídricos no mundo.
A plataforma hidropônica
Para avaliar a viabilidade de utilização das águas subterrâneas salobras no cultivo das hortaliças, tanto no Semiárido quanto no Recôncavo baiano, o pesquisador utilizou uma plataforma desenvolvida em uma casa de vegetação da Unidade Experimental do Núcleo de Engenharia de Água e Solo (NEAS) da UFRB, situada no município de Cruz das Almas. A plataforma hidropônica foi montada com madeira, calhas de PVC, dentre outros materiais que, de acordo com Vital Pedro Paz, o produtor do sertão pode adaptar. “[Essa tecnologia conta com] um reservatório de água com nutrientes que circulam numa calha. Para circular a água, utilizamos bombas plásticas de máquina de lavar”, explicou.
Sete tipos diferentes de água foram utilizados. Vital Pedro da Paz afirma que atuou com uma grande equipe para desenvolver o projeto, manuseando água doce e água subterrânea de um poço instalado na UFRB, em Cruz das Almas. No experimento também estavam incluídos o rejeito da dessalinização da água do poço perfurado em Caminhoá (BA); a combinação de 50% de água subterrânea do poço em Sapeaçu com 50% do rejeito da sua dessalinização; o rejeito do poço de Conceição do Coité e a água salinizada artificialmente com cloreto de sódio (NaCl).
Inviabilidade da dessalinização
O processo de dessalinização, segundo descreveu Vital Pedro da Silva Paz, foi realizado por osmose reversa (ou inversa), técnica bastante utilizada para o fornecimento de água potável em regiões semiáridas. Essa alternativa favorece o uso das águas salobras, já que ela pode trazer riscos ao meio ambiente ao promover a salinização dos solos, contudo, alerta para outro impacto. “Estamos tirando sal da água, mas estamos criando outro problema”, antagoniza Vital. Ele, por outro lado, apresenta como alternativa para o impasse, a diluição do rejeito da água dessalinizada em água doce.
O experimento
A estrutura de hidroponia foi composta por 42 unidades experimentais na qual a alface roxa foi a principal hortaliça. Foram cultivadas três plantas dessa alface que pertencia a variedade “Quatro Estações”. A colheita foi realizada 25 dias após o transplantio e, nesse momento, o número de folhas foi contato e a massa do vegetal foi analisada.
O projeto se mostrou vantajoso, principalmente por prescindir o uso do solo para sustentar o plantio dos vegetais. Além disso, Vital Pedro ressalta o aumento da produção em menores áreas sem a perda de água por evaporação e o uso eficiente dos recursos hídricos, já que a estrutura torna possível a sua reutilização por meio da constante circulação. O professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia constatou que a utilização de diferentes tipos de água não resultou em variações relevantes da produção da alface roxa. Em alguns casos, o uso de águas salobras até favoreceu a produtividade. “Temos que avançar um pouco na degustação. Quem gosta de alface, percebe um pouco de alteração no gosto, [mas nada que impeça o consumo da hortaliça]”, pontua.
*Edvan Lessa é estudante de Jornalismo da Facom/Ufba e bolsista da Agência Ciência e Cultura.
Trabalho com agricultores familiares em uma região com índices pluviométricos muito baixos, temos diversos poços perfurados nas comunidades, todos com condutividade alta. Esta pesquisa é muito interessante e
vai nos proporcionar ver novos horizontes para melhor aproveitamento deste recurso tão precioso.